quarta-feira, 15 de julho de 2009



15 de julho de 2009
N° 16031 - MARTHA MEDEIROS


O resgate da normalidade

A foto dá a entender que Obama está olhando o bumbum da menina de 17 anos que posou com os integrantes do G-8 na Itália, mas um vídeo da cena mostra que na verdade ele estava se virando para ajudar uma outra moça a descer as escadas, ou seja, um cavalheiro, e não um malandro. Mas lamentei o tira-teima. Queria que Obama estivesse, sim, olhando pro derrière da moça. Por quê? Porque seria mais um capítulo da minissérie Obama, o resgate da normalidade.

Obama é presidente dos Estados Unidos, cargo que automaticamente o coloca num pedestal, mas ele não faz o tipo que se empina. E o fato de ser o primeiro presidente negro do país lhe confere um status de pioneiro, mas ele tampouco fatura em cima desse pioneirismo. Age como qualquer preto comum ou qualquer branco comum: sendo comum. E é isso que o torna moderno.

Obama tem uma mulher que poderia ser a vizinha da porta ao lado e tem filhas que sempre sonharam em ter um cachorrinho, em vez de, sei lá, um tigre branco siberiano. Obama mata moscas, senta em escadas, tem dificuldade em parar de fumar e olha para traseiros femininos, e se não olhou naquele dia, olhará certamente em outros, discretamente, sem nenhum desprestígio à senhora sua esposa. Homens comuns fazem isso.

Pressinto no ar uma valorização da trivialidade descomprometida, aquela que existia antes da praga do politicamente correto, antes da avalanche de revistas de fofocas e antes dessa era em que tudo parece um grande teatro. Não me excomungue, mas vou ser mais uma a seguir falando do Michael Jackson.

Domingo passado eu esperei o Fantástico terminar só para ver as cenas dos vídeos caseiros onde o cantor aparecia caindo na piscina de roupa e tudo, fazendo guerrinha de bexiga d’água com os amigos, abrindo presentes de Natal e planejando comer um frango com farofa (a farofa é invenção minha, para tornar a cena ainda mais prosaica), ou seja, vivendo sua infância retardatária, mas, ainda assim, vivendo, e não representando.

Sujava-se, molhava o cabelo e gritava “eu vou te matar!” às gargalhadas, em meio a brincadeiras. Num tempo em que celebridades saem direto do palco para o museu de cera, eram imagens desfocadas de alguém normal se divertindo. Extra, extra!

A revista Quem possui uma seção que se chama algo como “Eles são como nós”, onde mostra fotos de famosos comprando aspirina na farmácia, fazendo sinal para um táxi num dia de chuva ou limpando a lente dos óculos na barra da camiseta, como se os desmascarasse: veja, eles não passam o dia todo dentro de um ofurô! Legal.

Assim fica mais fácil virar notícia. É só trocar o champanhe pela água do bebedouro, ser flagrado abocanhando um hambúrguer triplo com a maionese escorrendo entre os dedos, usar a balança do supermercado para se pesar, catar moedinha na hora de pagar o pedágio e comer frango com farofa. Aquela farofa que sempre faz falta quando o mundo fica besta demais.

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