terça-feira, 21 de julho de 2009



Gripe não é festa

21 de julho de 2009
N° 16037 - MOACYR SCLIAR

Nas epidemias não são só vírus e bactérias que se transmitem. Há também um contágio psíquico, que nada fica a dever ao contágio biológico e que se expressa sob a forma de informações e de boatos, em função dos quais as pessoas adotam práticas às vezes inesperadas.

É o que mostram notícias vindas de Londres, de Utah (EUA), do Canadá, e de outros lugares: pais estão organizando o que se chama de flu parties, festas da gripe.

Trata-se do seguinte: se uma criança está com a gripe suína, faz-se, na casa dessa criança, uma festa, para a qual são convidadas outras crianças. Mas e o risco do contágio?, vocês perguntarão. Não importa. Ao contrário, o objetivo da festa é exatamente fazer com que as crianças tenham gripe.

É preciso dizer, antes de mais nada, que isso não é coisa nova. Na verdade, é uma cópia de algo que, num passado ainda recente, era muito comum: as festas da rubéola (rubella parties) e as festas da varicela ou catapora (chickenpox parties).

E que tinham uma explicação: no caso da rubéola, as lesões do feto que podem ocorrer quando a mãe, grávida, contrai a doença. A ideia era fazer com que meninas tivessem rubéola antes de casarem e de engravidarem. No caso de varicela esta ameaça não era o motivo, mas mesmo assim os pais classificavam a doença na categoria “uma a menos”: era melhor enfrentar logo o problema e ver-se livre dele de uma vez por todas.

Agora, o detalhe interessante. Atualmente, existem vacinas tanto para rubéola quanto para escarlatina. Mas, curiosamente, muitos pais resistem à ideia de vacinar seus filhos e filhas.

No caso da rubéola circulou um boato, infelizmente gerado por um trabalho médico não suficientemente embasado, sugerindo que a vacina poderia estar associada ao autismo. Mas mesmo depois que se comprovou ser esse temor infundado, muitos pais continuaram evitando a vacina contra a rubéola, e a vacina contra varicela. O argumento é de que se trata de meios “não naturais” de evitar a doença.

Esta resistência, aliás, existia em relação à vacina contra a varíola. Muitas pessoas preferiam a chamada variolização, que consistia em inocular aqueles que ainda não tinham tido a doença com crostas das lesões variolosas. A pessoa inoculada contraía a varíola, mas esperava-se, sem muito fundamento, que a doença tivesse então uma forma menos grave. Esta prática, que, no Brasil, contribuía para o sustento de numerosos e muito populares curandeiros, foi uma das causas da inconformidade traduzida na Revolta da Vacina de 1904.

Atenção, pessoal: as autoridades sanitárias desaconselham as flu parties. É verdade que na imensa maioria dos casos a doença assume uma forma benigna (e os defensores da medida dizem que também se pode contar com o Tamiflu, droga antiviral, para combatê-la), mas há aí um elemento, ainda que pequeno, de roleta russa: é impossível prever que casos evoluirão de maneira grave.

As medidas contra gripe estão sendo muito bem divulgadas pelo Ministério da Saúde, pelas Secretarias da Saúde, estaduais e municipais, pela mídia, que está fazendo um excelente trabalho.

São estas as recomendações que se devem seguir, enquanto aguardamos a vacina. Festa é festa, e para muitas pessoas qualquer pretexto serve para fazer festa, mas o melhor é deixar a flu party para quando a gripe acabar.

Chegada à Lua: um salto gigantesco para a humanidade. Mas um salto em que direção?

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