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quarta-feira, 22 de julho de 2009
ANTONIO DELFIM NETTO
Caridade e verdade
NINGUÉM podia deixar de ter simpatia pela velha "opção pelos pobres" da Igreja Católica, agora transformada em "opção pelos homens", na nova Encíclica "Caritas in Veritate".
Para Roma, a organização econômica é subordinada. Deve adequar-se à concepção da ordem social orgânica da igreja dentro da qual está imersa. Esta última fundamenta-se na caridade, que é o valor supremo do cristianismo. Roma sempre recusou o liberalismo e o capitalismo, fundados no egoísmo e no individualismo, e negou o comunismo, criação de diabólicos "engenheiros sociais".
Para ela, corretamente, a economia deve ser submetida à ética. Entre esta sociedade cristã imaginada e a que vivemos, há enorme distância. Nada impede, entretanto, que com alguma ousadia ela seja encurtada. Se João Paulo 2º (com a ajuda da crise do petróleo de 1979!) derrubou o comunismo, por que Bento 16 não pode aspirar a cristianizar o fundamentalismo mercadista que dominou o mundo e parece produzir a atual destruição do homem?
Roma possui assessores (economistas profissionais da maior competência e mundialmente renomados) para analisar como funcionaria um sistema econômico cuja base seria a caridade e o altruísmo, problema tratado, aliás, em 1881, pelo grande economista F.Y. Edgeworth.
Parece claro que, se for possível dar à caridade o caráter de imperativo categórico em indivíduos agindo em plena liberdade e esse comportamento levar ao estabelecimento de uma certa ordem (como o egoísmo parece levar), teríamos um mundo muito melhor.
Uma coisa, porém, é certa. Isso não será feito por "economistas de sacristia". Roma, por exemplo, não defende o "calote das dívidas" como acontece no Brasil. No máximo, por conta da caridade, recomenda (como no velho Pai Nosso) que o credor perdoe o devedor mais pobre. Não que este a rejeite!
No Brasil, a negação da dívida externa tem uma longa história, mas não há assunto em que o país seja mais desinformado. Alguns livros didáticos são analiticamente pobres, ideologicamente oportunistas e, o que é pior, ignorantes das estatísticas. Para eles, a "história é a política projetada no passado"!
Ainda agora vimos ilustre eclesiástico afirmar que desde 1973 o Brasil tem "dívida externa terrível" e que não devemos pagá-la. A verdade é que o Brasil superou a recessão mundial de 1974/75 sem problema e com pequeno endividamento.
A afirmativa ignora que desde 1971 controlava-se a entrada de capitais: em 1973 o prazo mínimo para empréstimos externos passou de cinco para dez anos e o depósito compulsório para novos empréstimos foi aumentado em outubro para 40%. Por caridade, é bom procurar a verdade...
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