segunda-feira, 27 de julho de 2009



27 de julho de 2009
N° 16044 - SERGIO FARACO


Oficinas

Proliferam oficinas literárias no país – em Porto Alegre já não dá para contar nos dedos –, aplicadas por autores de renome, com formação acadêmica na matéria e muitas obras publicadas, ou por outros que ainda não são autores e cuja credencial é a prévia frequência à oficina de alguém.

Para que servem as oficinas?

Delas não desdenho e tampouco as gabo, não se engastam em meu métier, mas posso supor que venham a ser um bom lugar para algumas pessoas, desde que tenham o hábito da leitura. Exemplos que me ocorrem:

> Para quem ombreia no dia-a-dia o fardo da solidão: há de fazer amigos com interesses afins. É a “amizade útil” definida por Aristóteles, que pode evoluir para afetos menos ocasionais.

> Para contar com o mestre em leituras orientadas pela qualidade e não pela quantidade. Quem lê demais acaba não sendo lido, alerta Schopenhauer, citando Pope.

> Para a discussão da obra de grandes escritores sob quaisquer ângulos, tendo-se em vista que o estilo de um autor, como previne François Mauriac, é único, pessoal, e não se transfere a seus adeptos. E por aí vai.

E a questão cardeal: a oficina faz o escritor?

A crermos em Kant, não: “Tudo aquilo que Newton expôs em sua obra imortal sobre os princípios da filosofia natural, por mais poderosa cabeça que seja requerida para inventar tais princípios, pode-se perfeitamente aprender. Mas não se pode aprender a fazer poemas com espírito, por mais exaustivas que sejam todas as prescrições da arte poética e por mais excelentes que sejam seus modelos”.

Mas, se ministrada a oficina por alguém capaz de identificar no aluno um talento que não se assemelha ao seu, ela pode ajudá-lo. Subentendida a vocação, o exercício supervisionado talvez faça com que salte etapas que só superaria com mais experiência e maturidade, e isto equivale dizer, até para brincar com tão sério assunto, que o candidato a escritor poderia cumprir os traços essenciais da “revolução permanente”, como os delineou o velho Trotski em novembro de 1929.

Se vai dar certo são outros quinhentos. A de Trotski, aparentemente, não deu. A do oficineiro, bem, “o empenho futuro de cada aluno será o fiel da balança”, como escreveu em algum lugar o decano dos mestres, Luiz Antonio de Assis Brasil.

Então é isto: vocação. Mas em que consiste a vocação? Não sei. Talvez ela não seja uma condição que a gente sabe, mas algo cuja presença a gente sente.

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