Trabalho de parto
Para os homens, soa apavorante. Para mulheres que nunca pariram, mas pretendem um dia, é uma inquietação anunciada. Mas não há motivo para pânico, a dor é diluída no êxtase.
Está acontecendo: homens e mulheres do mundo inteiro estão em um trabalho de parto coletivo. É chato, dolorido, dá vontade de desistir no meio, mas não se interrompe um processo em curso, um nascimento tão aguardado. Um novo mundo foi gestado e está aí, chegando. Já começou a despontar. A cabeça já está para fora. Não há como retornar. O que precisamos fazer agora, juntos, é colocar mais pressão, dar mais estímulo, até que possamos celebrar: ufa, conseguimos.
Nunca é uma travessia fácil. De uma sociedade machista para uma sociedade mais igualitária: estamos a caminho. Mulheres e homens com os mesmos direitos, as mesmas oportunidades, sem que isso gere insegurança, sem que eles recorram ao ímpeto selvagem de matar suas namoradas e esposas caso elas deixem de amá-los. Estamos cada dia mais perto. Força!
Um mundo em que ser negro, pardo, branco, magro, gordo, velho ou moço não altere o tratamento que se recebe da polícia, no hospital ou na entrevista de emprego. Julgar pela aparência, pela cor e pela idade é coisa do passado. Chegamos até aqui. Há dilatação suficiente. Falta só mais um pouquinho.
Um mundo mais consciente sobre a necessidade de cuidarmos da nossa saúde mental e física. Em que ansiedade, depressões e demais distúrbios não sejam menosprezados, e que todos combatam o sedentarismo, seja caminhando, dançando, praticando um esporte ou treinando num parque ou academia. Respire fundo. Estamos quase lá.
A transição do mundo analógico para o digital é um cordão enrolado no pescoço, hora de ter cuidado: muita gente está seduzida pela fragmentação dos contatos, pelos estilhaços de notícias. As reflexões profundas lutam para sobreviver neste universo caleidoscópico. Nada voltará a ser como antes, é preciso se habituar com a tecnologia, fazer bom uso dela, mas sem deixar que a desinformação substitua o conhecimento. É o conhecimento que nos forma, independentemente da ferramenta.
Este mundo novo que foi tão desejado é o lugar em que nossos netos e bisnetos viverão: mantenhamos o otimismo possível. Tem dado um trabalhão parir uma era em que haja mais consciência ambiental e social. Não é fácil dar à luz um universo livre de preconceitos, menos embrutecido e menos tenso diante de diferenças que, afinal, nunca fizeram mal a ninguém. Estamos esgotados, mas nos esforcemos mais um pouco, lutemos por esta sociedade moderna, menos consumista e mais espiritualizada, que precisa, finalmente, nascer. Ela está com metade do corpo em nossas mãos e já dá para ver a lindeza que será.
MARTHA MEDEIROS
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