quinta-feira, 26 de outubro de 2023


Banco público não é moeda de troca

O que era especulação foi confirmado: o presidente Luiz Inácio Lula da Silva demitiu a presidente da Caixa, Rita Serrano, e a substituiu por Carlos Antônio Vieira Fernandes, servidor do banco público indicado para o cargo pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), em nome do centrão. O bloco parlamentar sem o qual nenhum governo parece capaz de aprovar projetos no Congresso havia se apropriado da pauta legislativa no período Bolsonaro, e segue recebendo nacos de poder. Além dos dois ministérios abocanhados, ganha o comando do maior banco do Brasil em operações de crédito (R$ 800 bilhões) e em número de clientes (150 milhões) e quarto em ativos (R$ 1,5 trilhão).

Mas a Caixa é mais do que uma instituição financeira portentosa nos números. Administra e distribui recursos de programas sociais - especialmente do Bolsa Família - e financia obras públicas, principalmente na área de saneamento básico, destinando recursos a Estados e municípios. É fácil de entender porque é tão cobiçada.

Mesmo depois que assumiu dois ministérios, em setembro, o centrão não comparecia com sua parte do acordo, ou seja, não fazia fluir ao menos a pauta econômica do governo no Congresso. A reforma tributária travou, propostas de reforço na arrecadação - como a tributação dos super-ricos - criaram teias de aranha nas gavetas. Até ontem, quando enfim avançou. Faltava a Caixa. Não falta mais. Em maio, Lira havia feito o diagnóstico: o governo Bolsonaro "descentralizava, acreditava e delegava", mas o de Lula "tem centralizado, não tem delegado e não tem acreditado".

A instituição vinha se recuperando do estrago de imagem provocado por um antecessor de Rita Serrano, Pedro Guimarães, que espetou conta de R$ 10 milhões nos cofres por indenizações pagas por assédio sexual. Transformar banco público em moeda de troca em negociação de apoio político é um mau sinal por princípio. Em um governo que proclama seu compromisso social, entregar uma instituição com tantos recursos e tantos braços, especialmente em ações destinadas a quem mais precisa, só acentua distorções que existem há décadas.

MARTA SFREDO

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