31 DE OUTUBRO DE 2023
OPINIÃO DA RBS
SINALIZAÇÃO RUIM
Foi desastrosa a manifestação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na sexta-feira sinalizando que não haverá maior esforço do governo para ter déficit primário zero em 2024. Tratava-se de um compromisso recentemente assumido pelo próprio Executivo, incluído no novo marco fiscal, aprovado pelo Congresso e sancionado por Lula há apenas dois meses.
A declaração do presidente indica pouca preocupação com a saúde das contas públicas e, por tabela, pode se refletir no comportamento do próprio parlamento. Se a figura que deveria ser a maior interessada no equilíbrio fiscal relativiza a importância de igualar receitas e despesas, que motivação teriam deputados e senadores para se engajarem nas pautas do governo voltadas a elevar a arrecadação e abrirem mão de propostas populistas que aumentam despesas ou renúncias?
As palavras de Lula, ademais, desautorizaram o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que até aqui, ao menos nas falas públicas, mantinha-se firme no propósito de buscar o déficit zero. O perigo é que, enfraquecido, Haddad perca a credibilidade perante os agentes financeiros por parecer que tende a perder a maior parte das quedas de braço no governo para a ala política.
Crescia nas últimas semanas a percepção do mercado financeiro de que o déficit zero no próximo ano não seria factível devido a aumento de despesas, frustração de receitas e incerteza sobre aprovação de medidas voltadas a elevar a arrecadação. O Boletim Focus, do Banco Central (BC), projetava ainda na semana passada déficit primário de 0,75% em relação ao PIB. Mesmo assim, a postura de insistir em que era possível alcançar a meta indicava ao menos a existência de um esforço direcionado para alcançar os objetivos. Mas quando o próprio presidente joga a toalha, a consequência natural é deterioração das expectativas.
O resultado, ainda na sexta-feira, foi um movimento brusco de queda da bolsa logo após a declaração de Lula, acompanhado de alta do dólar e dos juros futuros. O movimento prosseguiu ontem após Haddad, em entrevista coletiva, não assegurar mais ser possível déficit zero. Para o ministro, Congresso e Judiciário teriam de colaborar com o governo para o cenário mais provável ser revertido.
Lula não quer cortar gastos, por exemplo, em obras do PAC. Ainda mais pelo fato de 2024 ser um ano eleitoral. O que o presidente parece outra vez não querer enxergar é que, ao apontar para o descompromisso com as finanças, amplia o risco de recrudescimento da inflação e de o ciclo de corte do juro não alcançar o patamar desejado. A declaração infeliz de Lula também acontece às vésperas de mais uma reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC. Não se cogita que mude a decisão esperada de cortar a taxa Selic em mais 0,5 ponto percentual, para 12,25% ao ano, mas o desconforto quanto ao que poderá ocorrer em um horizonte mais largo pode aparecer no conteúdo do comunicado e na ata da reunião.
Desaponta o presidente não ter aprendido que a gastança cria apenas crescimentos ao estilo voo de galinha. A médio e longo prazo, alimenta a inflação e o juro, o que é péssimo para economia e para a população mais pobre, aquela parcela que Lula diz querer proteger.
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