Deslumbre exige entrega, atualizar-se demanda energia
Ando exausta da obrigação de ter que me atualizar a cada novidade tecnológica. Chega uma hora em que a pessoa não consegue mais absorver as evoluções.
Morrer tem que ter algum benefício, concorda? Deus não seria
tão sádico. Meu palpite: depois de quase 10 décadas aprendendo a viver, chega
uma hora em que a pessoa não consegue mais absorver as evoluções e, sei lá,
tirar uma soneca eterna já não parece má ideia.
Por exemplo, idosos 80+ se irritam ao realizar operações
bancárias através de aplicativos: “Chega, não quero mais brincar!”. Eu, uma
jovem senhora (ah, os eufemismos), também ando exausta da obrigação de ter que
me atualizar a cada novidade tecnológica. Achei que lidar com uma Smart TV
seria meu auge, mas veio essa Inteligência Artificial pra atazanar. Olha, ainda
quero brincar, mas sem fanatismo.
Ando com preguiça até de me maravilhar com apoteoses como a
The Sphere, em Las Vegas. É uma colossal casa de eventos com o maior painel de
led do mundo, em formato de globo. Foi inaugurada com um show do U2 e, a julgar
pelas imagens que vi, a imersão é lisérgica. Que abram muitas filiais da The
Sphere pelo mundo (ir a Las Vegas, não vou), mas me pergunto se as próximas
gerações saberão valorizar um banquinho e um violão. Apoteótico, para mim,
continua sendo Elis & Tom.
Outro projeto, ainda mais futurista: na Arábia Saudita estão
construindo uma cidade em linha reta, sem carros, nem ruas. Pense no Highline
Park, de Nova York, o simpático jardim suspenso criado sobre uma linha de trem
desativada. Pois não passa de um embrião microscópico do que será a The Line,
uma cidade com apenas 200 metros de largura e 170 km de comprimento (170
quilômetros!), um interminável corredor de três andares, 100% sustentável.
Revolução urbana. Se o projeto é tão incrível, como se explica o desassossego
que senti?
Por fim, um estúdio de design italiano está trabalhando no
Pangeous, um gigantesco navio elétrico em forma de tartaruga, com 550 metros de
comprimento e 610 de largura, que acomodará 60 mil passageiros – uma cidade
flutuante. Haverá um canal em seu interior, onde as pessoas poderão navegar,
praticar remo ou stand-up paddle.
Piscinas parecerão lava-pés, icebergs parecerão gelo picado,
montanhas parecerão formigueiros. Tudo está cada vez maior, mais alto, mais
largo. Fico de boca aberta, como se estivesse vendo o 14 Bis voar pela primeira
vez. E ainda nem falei no Google Glass, em breve sobre os narizes de todo o
planeta. Um computador de rosto.
Deslumbre exige entrega, atualizar-se demanda energia.
Avanços magistrais estão em curso, a 10 minutos de se tornarem parte da nossa
rotina. Acompanho pelas redes sociais, mas como absorverei o impacto do que for
novo daqui a 25, 30 anos? Com a velhice avançada, morrer será um prêmio. Trilha
sonora da eternidade: silêncio. Talvez, um banquinho e um violão.
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