18 de janeiro de 2017 | N° 18745
DAVID COIMBRA
Não acredite na pesquisa
Os números não mentem. Mas enganam. Não há melhor forma de enganar do que usar os números, porque, afinal, eles não têm opinião. São duros. Matemáticos. Incontestáveis.
Lula, perito em manipulação, dá uma aula sobre isso em um vídeo famoso na internet. Ele está na sede do seu instituto, ensinando:
– Como fui oposição muito tempo, cansei de viajar pelo mundo falando mal do Brasil. Era bonito a gente falar: “No Brasil tem 30 milhões de crianças de rua, no Brasil tem não sei quantos milhões de abortos”. A gente nem sabia. Se o cara perguntasse a fonte, a gente não tinha, mas a gente ia citando número.
É assim que se faz.
Mas Lula fazia isso num tempo em que a internet não era tão desenvolvida. Hoje, qualquer repórter foca que estiver ouvindo sua manifestação, acessará o Google pelo celular e poderá contestá-lo. A saída, então, é valer-se de uma “fonte oficial”.
Como a da pesquisa que jura que oito dos homens mais ricos detêm metade da renda da população mundial. Um autodenominado “instituto” lança esse número e os veículos de informação divulgam. Pronto. Tornou-se oficial. Ninguém pergunta nem qual foi o método da pesquisa.
No caso, gostaria de saber como esse instituto descobriu a renda dos 7 bilhões de seres humanos viventes. Dados dos governos? Os da Coreia do Norte, por exemplo, são confiáveis? E os do Brasil? O governo brasileiro sabe quanto circula na economia informal? Sabe qual é o patrimônio dos traficantes dos morros do Rio?
É impossível precisar qual é a renda da população mundial. Mas, ainda que a pesquisa fosse confiável, o que seus resultados indicariam?
Em algumas notícias que li a respeito, as fotos que as ilustravam eram de favelas miseráveis, lixões ou criancinhas esfomeadas. A sugestão é clara: muitas pessoas são pobres porque algumas poucas são muito ricas. Por esse raciocínio, existe uma massa imóvel de dinheiro no planeta, como um bolo. Se alguém fica com a parte maior, resta a menor para os outros comensais.
Mas o dinheiro não tem valor em si. O dinheiro só tem valor porque representa produtos ou serviços desejáveis. Acontece que o desejo das pessoas muda com o tempo. Tome um objeto que você usa todos os dias: o garfo.
O garfo existe há milênios, mas até a Idade Média era pouquíssimo usado. As pessoas comiam com as mãos. Cada um tinha uma faca com a qual espetava a carne. A sopa era bebida direto da tigela e o pão servia para capturar molhos. Isso porque o garfo não era muito prático – possuía apenas dois dentes e não sustentaria uma porção de feijão com arroz. Por volta do século 15, algum bidu teve a ideia de acrescentar um dente. Foi extraordinário, as pessoas podiam equilibrar a comida ali. Passaram-se mais cem anos, até que Fernando, um rei siciliano, irritado porque não conseguia enrolar o espaguete num garfo com três dentes, solicitou uma solução aos sábios da corte. Eles pensaram, pensaram e, sábios que eram, bolaram o genial garfo de QUATRO dentes. No começo, só os nobres comiam com aquele garfo, mas logo todos o empunhavam, todos queriam tê-lo. E, para isso, trabalhavam mais ou inventavam formas criativas para ganhar mais. Uma necessidade foi criada e, dessa necessidade, criou-se riqueza.
Faz apenas 500 anos que os homens sentem necessidade de ter garfos e apenas um ano que sentem a necessidade de ter iPhone 7.
É isso que faz o mundo girar: a inovação, o trabalho, a produção. O capitalismo! Foi o capitalismo que tirou o homem da miséria, é o capitalismo que torna móveis as classes sociais e que aumenta a qualidade de vida. As pessoas vivem melhor hoje por causa do capitalismo.
O problema do mundo não é a desigualdade entre o mais rico e o mais pobre. O problema do mundo é a desigualdade entre o pobre de hoje e o pobre de ontem. É esse o número que tem de ser considerado. Números não mentem, mas nem todos estão certos.
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