Jaime Cimenti
Menos Face,
mais Book Levei um bom tempo para entrar na internet, no Face, em outras redes sociais e em outros lances eletrônicos. Não chego a me arrepender de ter entrado nem me arrependo de não ter ingressado antes na web. Entrei nela porque dizem que senão eu não existiria mais. Será? Ouço este silêncio dessas três e meia dessa tarde de sol que sugerem um daqueles velhos cafés da tarde, com pão quente direto da padaria, manteiga ou patê, bolinhos de chuva, geleia de uva de Bento, queijo, salame, mortadela, presunto e outras gostosuras e fico pensando que não se deve deixar de ouvir o silêncio. Ele ainda tem muito a dizer.
Diz umas coisas que a gente não sabia que sabia e traz umas vozes e revelações lá de dentro que a gente pensa que não tinha ou tinha esquecido. Pois é, o silêncio anda meio escasso, mas ainda existe. Faça parte da Confraria do Silêncio. Sozinho, fique em silêncio alguns minutos por dia, fazendo nada. Uns minutos, eu disse. Se der umas horas, melhor para você, que poderá atingir um nirvana indo-baiano e se tornar pós-graduado na ciência do nadismo. Mas disse lá em cima: menos Face e mais Books. Não é coisa original, mas é bom de repetir.
Estou com mais de 2.600 amigos no Face. Nada perto do 1 milhão de amigos que o Rei queria e que hoje devem ser uns 80 milhões, mas fico pensando que talvez seja uma overdose de amizade. Não consigo falar com todos. Para uns, respondo, para outros, não. Curto aqui, não curto ali. Uns dizem que sou esnobe, que não respondo.
Outros que respondo, comento e curto muito demais. Têm dias que respondo ansioso, apressado, querendo ser inteligente e engraçado. Outros, me comunico mais básico. Outros dias estou fora. Sei lá qual a quantidade ideal de horas diárias. Quem sabe? No fundo, estou meio dependente deste lance de estar sozinho e junto com 2.600 e poucos amigos. Nesta tarde, depois de ouvir o silêncio e escrever estas linhas sem destino, pé e cabeça para meus desavisados leitores, acho que preferia uns contatos presenciais com o planeta e com os terrestres.
Ou até com extraterrestres, especialmente se os extraterrestres forem parecidos ou iguais a gente. Seria interessante. Menos Face, mais Books, recomenda o colunista de livros do JC, meio suspeito para isso. Mais contato presencial, usar os cinco sentidos e as percepções extrassensoriais, andar pelas ruas, dar de cara com o vento, a chuva, o ar, o calor e o frio. Dar de cara com as caras de verdade concretas das pessoas ao vivo, sem photoshop, montagem e sorrisos Colgate todo tempo. Imaginar, inventar e reinventar em cima de pessoas, cores e objetos de pegar com as mãos e tocar com o corpo.
O mundo eletrônico-virtual é, às vezes, meio insosso e inodoro. E colorido, barulhento e palavroso demais. Não temos ouvidos, olhos e cérebro suficientes para tanta palavras, imagens, sons, notícias, mentiras e histórias mil.
a propósito...
Volta e meia, sério, é preciso dar uma parada, ouvir o silêncio, olhar as nuvens, esquecer a parafernália eletrônica e fazer de conta que está num antigo veraneio, nos anos 1950, num hotel de madeira de Santa Terezinha. Aí você vai sair caminhando na noite imaginária, pés na areia, olhos nas estrelas e na lua e vai recolher uns mariscos na beira do mar. Com os mariscos, você vai fazer um risoto real, concreto, de pegar com as mãos e comer de joelhos. Coisa básica, simples, receita da nonna lá da Itália.
No dia seguinte, depois do almoço, alguém do aviãozinho teco-teco vai jogar o fardo com jornais na duna e aí, com calma e preguiça, você vai ler as notícias velhas. Mas ouvindo só a canção das ondas do mar e as conversas monossilábicas das gaivotas. - Jornal do Comércio.
(http://jcrs.uol.com.br/_conteudo/2017/01/colunas/livros/543460-capitulo-inedito-da-historia.html)
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