domingo, 8 de janeiro de 2017

vinicius torres freire -Está na Folha desde 1991.
Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.

Na semana das chacinas, governo se mostra outra vez incapaz


O presidente e seus ministros costumam se queimar quando têm de enfrentar a luz do sol a fim de conversar com o povo ou lidar com uma crise em público. Não foi diferente no caso dos massacres do Amazonas e de Roraima. 

O despautério estava de bom tamanho quando o secretário da Juventude da Presidência da República resolveu encerrar a semana de modo apoteótico, enfiando uma estaca de madeira no próprio peito e outra no coração da decência do país, pedindo mais chacinas de presidiários. Esse Bruno Júlio (PMDB) caiu. Outras criaturas continuam de pé na mesma tumba de onde ele saiu. 

A frequência dos disparates não torna o governo apenas anedótico ou grotesco, o que em si é um problema. Revela figuras que parecem habitar uma cripta entre bolorenta e francamente reacionária, alheia às conversas ilustradas básicas, incapaz mesmo de manter as aparências em público, fazer demagogias, "relações públicas" pragmáticas. 

É difícil lembrar ocasião em que o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, vindo a público, não tenha provocado ou amplificado uma crise, como de novo o fez com sua balbúrdia de declarações na semana de chacinas. É uma estrela de uma companhia que não sabe o que diz. 

Pouco depois de empossado, o governo chegou a dar uma ordem de silêncio aos ministros, figuras com triste dificuldade de se expressar em português e que apresentavam planos toscos. 

Difícil esperar outra coisa de gente obscura por mérito, que não se destacou de modo profissional, acadêmico ou na política dos assuntos que devem administrar. O problema não vem de hoje, claro. A degradação no loteamento de cargos vem desde FHC. Parecia ter chegado a um cúmulo nos últimos dias de Dilma Rousseff. Mas não. 

Nem se trata aqui de ministros de negócios extraordinários ou acusados de ordinarices, na Lava Jato ou em outras lavagens. Deixe-se tal problema para os dias da publicação das obras completas da Odebrecht. 

Chama-se a atenção para a incapacidade do governo nem de inspirar confiança, mas de evitar escárnio ou repulsa. Parece gente quase toda imersa nas suas vidas passadas de pura mumunha da política politiqueira mais decrépita de PMDBs e centrões. 

Decerto o governo não está alheio à defesa, aliás legítima, de tal ou qual interesse, embora o faça de modo instrumental, sem convicções. O PMDB negocista-estatista se tornou liberal por conveniência. Nem se pode dizer também que alguns estejam desconectados da realidade bruta do Brasil, onde metade do povo acha que "bandido bom é bandido morto". 

Mas, em suma, a mistura de ilegitimidade, inépcias, jequices e baixa formação no governo não dialoga com um país já complexo como o Brasil, com "esquerda" ou "direita", "modernos" ou "atrasados".
Afora na economia, e olhe lá, não inspira respeito em quem debate o país de modo sistemático e informado. Não dá esperança a uma população que, desde o estelionato eleitoral e, ainda mais, depois do impeachment de Dilma Rousseff, quer eleger outro governo. 

A falta de competência ou mesmo de pragmatismo nas artes de governo e da conciliação degrada ainda mais um ambiente de desânimo ou revolta, o de uma crise que vai arrochar o cidadão comum até quase o fim de 2017.

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