quinta-feira, 8 de dezembro de 2011


Clóvis Rossi

Falam os convidados de pedra

Líderes sindicais europeus desmontam os palpites dos mercados, que erram sem sofrer nenhuma punição

Você levaria a sério uma análise do ex-ministro Carlos Lupi sobre o risco para os cofres públicos do duplo emprego? Ou um texto do também ex-ministro Antonio Palocci sobre a compatibilidade entre a função pública e consultorias privadas?

Se respondeu sim, tenho uma ótima sugestão de leitura: os relatórios das agências de avaliação de risco, tão micados quanto os hipotéticos trabalhos de Lupi e Palocci. Afinal, as agências de "rating" mantiveram a nota máxima para papéis que não passavam de lixo, puro lixo, no famoso caso das "subprime", origem da crise de 2008, cujo repique está se dando agora.

Essas mesmas agências deram nota máxima para uma certa Enron, que quebrou pouco depois. Cometeram ainda um pequeno erro de US$ 2 trilhões, no episódio de retirada da nota máxima dos Estados Unidos.

Com todo esse passado escandaloso, as agências continuam a ser levadas a sério, do que dá prova a reação dos governos europeus à ameaça da Standard & Poor's de rebaixar a nota de 15 dos 17 países da eurozona, até da austera e pura Alemanha.

Dá vontade de dizer "bem feito". Quem mandou os governos não adotarem medidas para controlar o poder dessas instituições de dar palpites mesmo depois de uma sequência de fraudes, como as apontadas?

Não o fizeram porque o que os argentinos chamam de "pátria financiera" manda, e os governos obedecem, uma e outra vez.

Ah, é bom dizer que o jornalismo também tem boa parte da culpa, porque continua publicando avaliações dessa gente, sem lembrar seu passado.

Enquanto soa, alta e forte, a voz dos mercados, cala-se a de agentes sociais mais representativos, porque eleitos.

Por isso, me surpreendeu ver ontem em "El País" uma página inteira assinada por oito líderes sindicais da Espanha, França, Alemanha, Itália e Bélgica. Trata-se de uma análise muito mais séria e realista do que as avaliações de agentes do mercado.

Diz, por exemplo, que a Europa, já no ano passado, "para recuperar a confiança dos mercados financeiros e permitir que seus agentes financiassem os Estados europeus e taxas de juros razoáveis", implementou "políticas de austeridade, baseadas no corte do gasto público e nas chamadas reformas estruturais". Essa expressão, quase sempre, não passa de codinome para recortar direitos dos assalariados.

Continua o texto: "Essas políticas fracassaram. No terreno econômico, a crise das dívidas soberanas está mais disseminada e é muito mais aguda do que antes, o crescimento caiu bruscamente em quase todos os Estados, e o desemprego aumentou onde os cortes orçamentários foram mais fortes".

Os líderes sindicais apontam "uma forte erosão da coesão social", ao que eu acrescento uma erosão também dos mecanismos democráticos, muito evidente, por exemplo, nas recentes trocas de governo na Itália e na Grécia.

Quem quiser a íntegra está em http://bit.ly/rD7iqv.

Vale a pena para, ao menos, ouvir outra voz que não a dos principais responsáveis pela crise.

crossi@uol.com.br

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