sexta-feira, 16 de dezembro de 2011



16 de dezembro de 2011 | N° 16919
PAULO SANT’ANA


Revezamento de ânsias

Embarquei ontem no táxi de prefixo 2098, pilotado pelo taxista Luiz Adriano Soares.

Conversa vai, conversa vem, o taxista me disse que esses dias embarcou no seu táxi uma senhora. Ele perguntou o que ela fazia. E ela respondeu que pertencia a uma ONG. Então ele quis saber o que fazia sua ONG. Ela respondeu que sua ONG tratava de preparar as pessoas para a velhice.

Pensei eu comigo: que bonito preparar as pessoas para a velhice!

Mas o taxista não pensou assim. Ele disse para a senhora que vai começar a preparar sua velhice quando completar cem anos de idade.

Interessante, esse taxista com quem eu conversava tem somente 50 anos de idade. Acontece que os homens que não são velhos, como esse taxista, não têm medo da velhice. Mais interessante é que enquanto os moços não têm medo da velhice, os velhos têm medo pânico da morte.

Só sabe o que de nocivo significa a velhice quem é velho. Quem ainda não envelheceu nem liga para a velhice. Só vai ligar quando pretear o olho da gateada.

Mais interessante ainda: a criança aspira à maturidade, os moços desdenham da velhice. E os velhos detestam conviver com a ideia da morte.

Eu só queria saber o que pensam disso tudo os mortos, mas infelizmente nunca tive contato com eles.

O meu taxista de ontem é tão forte, tem uma compleição tão robusta, que pretende que só irá envelhecer quando completar cem anos.

Ele não sabe, na sua inocência, que, quando fizer 65 anos, começarão os seus problemas corporais.

Mas o melhor mesmo é que fique imerso em suas ilusões.

Ontem foi o dia de andar de um médico para outro, usando os táxis.

À tardinha, embarquei no táxi de prefixo 2627, pilotado pelo taxista Nilmar Silveira Santos: a história dele foi muito menos amena que a do primeiro taxista: foi assaltado esses dias na Lomba do Pinheiro.

Eram quatro os assaltantes, quase meninos. Um calçou-o com um revólver, roubaram dele o dinheiro, o relógio e outros objetos.

Saíram do carro, mas o assaltante que portava o revólver queria que ele, o taxista, descesse. Ele imaginou que seria morto e acelerou o carro, quando o assaltante atirou na sua cabeça. A bala penetrou perto da orelha e foi parar na sua bochecha esquerda.

Como o local é muito enervado, no HPS não quiseram mexer na bala, que ainda se encontra, sem problema, na bochecha do taxista. Ele abriu a boca e mostrou a bala, que se pode ver encravada nitidamente na bochecha, incrível.

Ele me conta sua história com aparente tranquilidade, como que demonstrando naturalidade em ser assaltado e baleado, o que deve considerar como ossos do ofício.

São uns heróis, esses taxistas de Porto Alegre!

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