quarta-feira, 4 de maio de 2011



04 de maio de 2011 | N° 16690
JOSÉ PEDRO GOULART


O aço da vingança

Osama bin Laden comandou a maior façanha diabólica da humanidade, mas não teve coragem de uma derradeira, aquela que coroaria os feitos mirabolantes: matar-se. Ao contrário, Bin Laden deixou que sua cabeça fosse alvo do inimigo por longos anos até que o aço da vingança a atravessasse.

Apanhado vivo, acuado, numa casa de muros largos e paredes altas, acabou servindo o próprio sangue como detergente de ação apaga mito. O homem que propagava o suicídio como ato de fé deixou escapar a imagem de “mártir intocado”, decidindo como e onde iria morrer, desenhando “ele” o traço final do próprio destino.

Talvez a crença na vida eterna, repleta de virgens e rios de mel, não fosse tão clara. Sacrificar exércitos pontilhados de desconhecidos é sempre mais fácil, a história está cheia de exemplos. Mas, na hora da pomada, a maioria procura tirar o seu da reta e prefere esperar os milagres jogando gamão.

Desconectado do mundo, o saudita não significava mais muita coisa em termos práticos, era um homem, só; mas um homem cuja simples ideia de que estivesse solto e impune significava um desaforo. E caso Osama bin Laden resolvesse se autoeliminar, sob pompa e circunstância, o desaforo seria eterno. Teria feito o que fez e ainda sairia de cena conforme o manual, sem ninguém para fazer xixi em cima do corpo dele (alguma dúvida?).

Vivemos um tempo de imagens, os americanos queriam desaparecer com a de Osama. Nem mesmo um túmulo – nada que pudesse significar algo que perpetuasse a saga antagônica cujo logotipo é a cara do sujeito. Se preso fosse, a imagem dele algemado, humilhado, iria incendiar ainda mais os corações já inflamados dos seguidores.

Coube ao homem de nome semelhante comandar e anunciar o sucesso da operação “olho por olho”. Se alguém praticamente sozinho foi capaz de mobilizar tantas forças contra si, como Osama bin Laden, é de se esperar que Barack Obama faça do término da caçada à cabeça do saudita um início de compensações ao mal que ela criou ao mundo.

Uma boa maneira seria uma pauta de desativação dos arsenais nucleares americanos, dando início a um movimento global antes que surjam outros Bins Ladens ainda mais perigosos; outra, seria confirmar a imediata retirada das tropas do Iraque, em respeito a todas as soberanias do planeta.

Sobretudo, tratar os inimigos com distinção, na mesma medida que essa palavra, distinção, é a que nos distingue daqueles cujas ações abominamos.

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