terça-feira, 24 de maio de 2011



24 de maio de 2011 | N° 16709
FABRÍCIO CARPINEJAR


Cúmulo do azar

Se nascer fosse por sorteio, não estaria aqui. Nunca venci nenhum. Nem rifa na escola. Muito menos de galeto de igreja.

Acho que me faltou traquejo popular, arruda, figa, reza braba, assistir ao Silvio Santos e seu baú da felicidade. Careci de treino. Quando pequeno, não jogava bingo com cinamomos. Quando adolescente, rompi corrente de cartas e e-mails, os remetentes não me perdoaram e amaldiçoaram minha caixa postal.

Não levei TV, geladeira, máquina de lavar das contribuições mensais para entidades carentes. Por mais que levante a carteira de sócio no estádio, a camiseta do time não pousará em meu armário.

O vizinho Geraldo arrebatou uma bicicleta de rede de lojas. Minha mãe arrecadou um liquidificador do Pão dos Pobres. O tio Otávio foi escolhido para uma viagem a Porto Seguro com acompanhante.

Há sempre alguém perto de mim que teve um tiquinho de bênção, um naco de fortuna, uma fatia de torta do destino.

Não desprezaria grampeador, caixa de lápis de cor, passeio no Cisne Branco. Qualquer prêmio para esnobar aos amigos e familiares. Qualquer oferta, para dizer que os dias não são iguais.

Mas sou um azarado. Vivo colocando cupons em arcas transparentes nos shoppings, guardando notas e números, conferindo extrações da Caixa Federal, mas carro zero não entrou em minha garagem. Sorteio de livros em lançamentos não vem para mim, sorteio de ingressos na rádio não encontra meu nome. Numa festa de aniversário, todos receberam brindes, menos eu. Sequer ganhei um final de semana num motelzinho de estrada.

A sorte não brinca comigo. Eu me vejo como resultado da insistência. Não espero facilidades e recompensas do acaso. Trabalho desde cedo para me aposentar tarde.

O que não merecia é ser traído pelas promoções de restaurantes e locadoras.

Minha ambição era completar 10 locações para merecer um filme grátis. No momento em que partia para o último X, a locadora fechou. Aquilo me magoou. Quase depredei o local. Fui contido pelos amigos imaginários.

No restaurante Parrila del Sur, repeti o feito. Talvez demore meses para preencher os quadradinhos, sei lá; quando fui descontar a dezena, não existia mais a oferta. Arre, é muito olho-gordo, coincidência lazarenta.

Triste mesmo é ver que fui sorteado apenas pelo Imposto de Renda para a malha fina.

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