quinta-feira, 18 de novembro de 2010



18 de novembro de 2010 | N° 16523
CLAUDIA TAJES


Pensar para dentro

Uma curiosidade sobre o Twitter é que, depois dele, pensar para dentro virou coisa do passado. Agora, qualquer pensamento é imediatamente tuitado, inclusive aqueles que, por prosaicos, íntimos ou desinteressantes, deveriam continuar guardados na cachola de seus donos.

Um exemplo: maravilhoooooooooooso, sobre o show do Paul McCartney, foi tuitado por parte da multidão que esteve no show, por estranho que seja lembrar do Twitter no meio de um show maravilhooooooooooso.

Quando acontece de um pensamento não escapar pela internet, é comum que fique martelando na cabeça até se transformar em algo com mais de 140 caracteres. Assim nascem os livros, as músicas, os filmes, as teses, as ideias, enfim.

Claro que nem sempre um pensamento encravado se torna produtivo. Com certa frequência, ciumentos armam a maior briga após muito pensar. Matutando sobre a crise financeira, alguns chefes decidem enxugar os quadros. E nada deprime mais do que pensar em uma paixão que não deu certo.

Mulheres não foram, historicamente, encorajadas a puxar pelos neurônios. Até porque, se pensar muito, não casa, aconselhavam as mães. E não casa mesmo, considerando os pretendentes sem as qualificações mínimas imaginadas pelas mais românticas.

Pensando bem, no quesito Homens, a mulherada não faz muita filosofia, com o agravante de que o amor sempre nos emburrece um pouquinho. Nada grave. Passada a primeira fase, a do deslumbramento, volta-se a pensar. Por isso é comum não haver a segunda fase, seja ela qual for.

Já o fabulário sobre seres do sexo masculino dá conta de que eles são capazes de pensar com dois órgãos distintos. Um é o cérebro. Resta identificar o outro. Coração, no caso dos bondosos? Estômago, na hipótese dos gulosos? Fígado, em se tratando dos amargos? O negócio é abrir o Atlas de Anatomia e procurar a resposta.

O escritor português Gonçalo M. Tavares sugere, em um de seus contos, que se pense para dentro como um exercício, algo assim como fazer apoios ou abdominais. Sobre este autor, o ganhador do Nobel de Literatura, José Saramago, disse ser uma ofensa alguém tão jovem escrever tão bem. O exercício, portanto, tem dado resultados para o Gonçalo.

Com um detalhe: ele não tem Twitter.

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