quarta-feira, 17 de novembro de 2010



17 de novembro de 2010 | N° 16522
PAULO SANT’ANA


Noel, Cartola e Lupicínio

Sou fixado em Noel Rosa, o sambista carioca cujo centenário de nascimento está sendo comemorado neste ano.

Noel Rosa era um moço boêmio, seresteiro, sambista e tinha um gênio para compor.

Fazia dois sambas por dia, a maioria não foi gravada, mas deixou mais de 200 músicas para a eternidade.

Ele cantava assim quando estava em meio a uma noitada de samba:

Sol, pelo amor de Deus, não venha agora,
Que as morenas vão logo embora.

Há uma passagem da vida de Noel Rosa que me cala fundo. Ele fazia noitadas em companhia de outro gênio da música brasileira, Cartola.

Não raras vezes, quando terminavam as noitadas, Cartola convidava Noel para que ele fosse dormir no seu barraco, no Morro da Mangueira.

Noel ia, e, quando os dois se acordavam, dona Zica, a célebre fundadora da Mangueira e mulher de Cartola, punha os dois dentro de uma grande lata, que servia de banheira, e lhes dava banho com o auxílio de uma caneca e uma esponja.

Depois de banhar os dois, dona Zica servia-lhes um possante café com sanduíches e os soltava de novo morro abaixo em busca de outras serenatas.

Noel e Cartola compuseram alguns dos maiores clássicos da MPB.

As Rosas não Falam, de Cartola, e Último Desejo, de Noel, são os dois que escolho como soberanos.

Mas tudo o que compuseram foi e é lindo, e essa primeira parte de um samba de Noel Rosa que publico agora é o máximo de inspiração a que pode chegar um sambista:

Seu garçom, faça o favor
De me trazer depressa
Uma boa média
Que não seja requentada
Um pão bem quente
Com manteiga à beça
Um guardanapo
e um copo d’água bem gelada.
Feche a porta da direita
Com muito cuidado
Que não estou disposto
A ficar exposto ao sol
Vá perguntar
Ao seu freguês do lado
Qual foi o resultado
Do futebol.

Junte-se a Noel e a Cartola o nosso porto-alegrense Lupicínio Rodrigues.

Por sinal, quando Noel Rosa esteve em Porto Alegre, por volta de 1933, fazia um show com o Rei da Voz, cantor Francisco Alves, no então Cinema Imperial, da Rua da Praia.

E, no show, quem estava assistindo na primeira fila era um soldado do Exército chamado Lupicínio Rodrigues, que ainda não era então o grande mestre que viria a ser nos anos seguintes.

Noel, Cartola e Lupicínio, que constelação!

E Noel Rosa morreu com apenas 26 anos de idade. Imaginem se tivesse chegado aos 60 ou 70 anos de Lupicínio e Cartola!

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