sábado, 9 de janeiro de 2010



10 de janeiro de 2010 | N° 16211
MARTHA MEDEIROS


Mulheres de bronze

Já cometi atentados contra a minha pele. Aos 16, 17 anos, ia para a praia de manhã e ficava até o último raio de sol, sem protetor.

Em minha defesa, digo que naquela época (Antes de Cristo) não se falava em camada de ozônio e o máximo que se colocava no rosto era Hipoglós, que deixava a nossa turma parecendo uma tribo de aborígenes. Desencanados e desavisados, torrávamos enquanto o rádio tocava: “Garota, eu vou pra California...”.

Como sempre vivi no Sul, e aqui no Sul existe uma coisa chamada frio, o verão é a época de aproveitar cada réstia de sol para perder o desbotado e ficar preta, preta, pretinha. Depois vem o inverno e só no verão seguinte para recuperar aquele tom saudável – que eu achava que era saudável.

As coisas mudam, inclusive essa coisa chamada eu.

Outro dia estava dando uma espiada no livro do maquiador Duda Molinos quando deparei com uma afirmação que me calou. Diz ele que não tem coisa mais cafona do que uma mulher bronzeada demais. É uma bandeira de que ela não tem nada mais produtivo pra fazer na vida. Hoje eu concordo e vou mais longe.

Mulheres que não pegam sol e mantém-se alvas, peroladas, fazem um tipo interessante, provocam um efeito Nicole Kidman.

Mulheres que mantém um tom dourado, contrastando com os dentes branquinhos e com a camiseta clarinha, são um charme.

Mas exagerar no bronzeado deixou de ser uma atitude inteligente, e a gente sabe que a inteligência e a beleza têm parentesco, sim. Algumas esquecem o rumo de casa e fixam residência na praia: são as primeiras a chegar e só saem de lá quando o sol se esconde atrás do último edifício da orla. Sorte delas que os prédios estão cada vez mais altos e roubam a luz mais rápido. São as únicas que se beneficiam com a especulação imobiliária, pois se houvesse apenas as casas de outrora, elas ficariam fritando até o Jornal Nacional começar.

Por algum desvio de ótica, nunca achamos que estamos suficientemente bronzeadas. Não nos consolamos com um tom de chocolate ao leite: queremos o tom de chocolate amargo, que só é lindo para quem traz a cor do berço.

Longe de mim detonar com o sol. Sou leonina e nunca fui pela sombra. Se pudesse, passaria o dia lagarteando.

As recomendações dos dermatologistas de só pegar sol antes das 10h e depois das 16h são maravilhosas para se evitar melanomas, manchas e o envelhecimento precoce, mas sou politicamente correta só até a página 2 – alguns dos meus prazeres são tão imperativos que surram minha bem-intencionada consciência. Mas não abuso, juro que não abuso. E uso protetor solar sempre.

Resultado: no verão, fico neguinha, mas não a ponto de parecer que não tenho mais nada de produtivo pra fazer na vida. Tenho. Esse texto de hoje não é o melhor exemplo, mas tenho.

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