quinta-feira, 28 de janeiro de 2010


CARLOS HEITOR CONY

A lágrima

RIO DE JANEIRO - Eu a encontrei numa reunião social. Era fácil saber quem era, todos a conheciam, uma profissional bem-sucedida, por todos admirada. De repente, reparei nos olhos dela e vi que eram feitos de água, uma água misteriosa, que parecia lágrima. Tive a impressão de que a moça não era feita de carne, mas de pranto que ela reprimia dentro de si.

A impressão passou. Outras pessoas se aproximaram, a moça voltou a ser o que todos pensavam que ela era, uma deusa, todos a devoravam, e ela parecia estar à vontade, fazia o jogo, ria e se divertia como todos. Mas guardei aquela impressão: a da lágrima que ela trazia, seca, nos olhos imensamente verdes.

Mais tarde, a conheci numa viagem. Tomei coragem e disse-lhe de minha primeira impressão, que ela parecia estar sempre na véspera do pranto, que as lágrimas ficavam imóveis, congeladas em seus olhos, não faziam o roteiro habitual das lágrimas, não desciam pelo rosto, ficavam estanques, dando brilho nos olhos que já brilhavam de tanto verde.

Ela me olhou surpreendida. "Mas como? Você me acha infeliz? Tenho tudo na vida!". Então eu disse: "Sei que você é feliz, uma deusa, mas talvez seja uma deusa com vontade de chorar um choro escondido".

A moça abriu a bolsa e me mostrou pela metade a foto de um menino. Era seu filho. Filho de uma deusa. Era um menino bonito, tinha mais ou menos o mesmo olhar da mãe, só que não eram líquidos, como uma lágrima.

Quis ver a foto inteira. Ela hesitou, pensou em me mostrar a foto, mas guardou-a na bolsa, num gesto quase involuntário. Com um sorriso triste sem tristeza, mas conformado, me explicou: "Ele nasceu sem as mãos. Tem 8 anos, é lindo, é o primeiro na escola. Mas não tem as mãos. E eu não nunca mais tive vontade de chorar".

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