terça-feira, 26 de janeiro de 2010

img src="http://www.entrelacos.blogger.com.br/Claudio _Moreno.gif">

26 de janeiro de 2010 | N° 16227
CLÁUDIO MORENO


Lobo na pele de cordeiro

As fábulas de Esopo sempre trazem algum singelo ensinamento. Embora os personagens sejam na sua maioria animais, é das fraquezas humanas que nos falam essas pequenas histórias educativas.

Nosso velho conhecido, o lobo que veste uma pele de cordeiro para iludir o rebanho, simboliza os que tentam mudar a aparência para simular algo que na verdade não são. Neste jogo entre o ser e o parecer, a opinião de Esopo continua moderna: censuramos os que não são autênticos, pois todo aquele que tenta parecer o que não é deve ter alguma intenção suspeita ou algum motivo nem sempre confessável.

O mundo da fábula, contudo, era simples e singelo; Esopo ficaria confuso se viesse a conhecer Cinderela, cuja história inverte o caminho do lobo. O seu verdadeiro “eu” (seja lá o que isso quer dizer) estava escondido sob uma aparência inexpressiva; foi só quando a fada boa forneceu uma aparência luxuosa – o vestido, a carruagem, os sapatinhos e tudo mais – que seu lado exterior passou a ser compatível com a princesa que ela sempre tinha sido.

O pobre lobo se disfarçou para esconder o que era; Cinderela se disfarçou para tornar-se ela própria. O mundo, realmente, foi ficando mais complexo.

Agora não fingimos ser outra pessoa, pois estamos ocupados demais em fingir que somos nós mesmos – seja para reforçar o modo como nos imaginamos, seja para mostrar às pessoas que nos cercam a versão a que elas se habituaram.

O fotógrafo Richard Avedon deu um depoimento impressionante sobre sua mais famosa modelo: “Marilyn Monroe era alguém que Marilyn Monroe inventou, assim como um autor e seu personagem. Durante horas ela cantou, dançou, piscou o olho, sorriu e tudo o mais que se esperaria de Marilyn Monroe. Depois, seu rosto ficou vazio”. Em geral, não chegamos a este extremo, mas reconhecemos muito bem a situação.

O mundo de Esopo virou de cabeça para baixo. Não existe mais um limite nítido entre o ser e o parecer. Na peça A Importância de Ser Ernesto, de Oscar Wilde, o personagem, que sempre tinha usado o nome falso de Ernesto, descobre finalmente que este era mesmo o seu nome verdadeiro.

Ele diz à sua noiva: “É terrível para um homem descobrir de repente que em toda sua vida sempre disse a verdade. Você me perdoa?”.

A resposta dela é perfeita: “Perdoo, sim – pois eu sinto que você vai conseguir mudar”. Nem o lobo, nem o cordeiro escaparam da indecisão geral. Winston Churchill comentou, a respeito de Clement Attlee, seu oponente político:

“Ele é um cordeiro na pele de um cordeiro” – enquanto um cordeiro pós-moderno vai acabar confessando a seus pares: “Às vezes desconfio que sou um lobo vestido de mim mesmo”.

Nenhum comentário: