quinta-feira, 7 de janeiro de 2010



07 de janeiro de 2010
N° 16208 - PAULO SANT’ANA


Dalva e Herivelto

Pouco menos de um ano atrás, escrevi uma coluna inteira sobre Dalva de Oliveira, sem sequer cogitar que a TV Globo estava preparando uma minissérie sobre a vida da cantora.

Quando escrevi sobre Dalva de Oliveira, pretendi tentar remotamente um resgate da memória da cantora, desconhecida hoje por todos. Daí que vibrei quando soube da minissérie, na esperança de que ela fosse celebrizar para as gerações atuais e futuras a obra dessa grande e máxima intérprete.

E digo assim porque na minha coluna sobre Dalva cometi com algum remorso a audácia de classificar a intérprete de Ave Maria no Morro como superior em vocalização a Elis Regina.

Esta é a bobagem que a gente comete de sempre querer saber quem foi a melhor, quem foi o maior, temos a mania de ranquear valores quando estamos a discuti-los, quando devíamos apenas examiná-los, sem querer saber qual foi melhor que o outro.

Imaginem, então, os leitores com que curiosidade fiquei aguardando a estreia de Dalva e Herivelto, Uma Canção de Amor.

E confesso ao leitores que me frustraram os dois primeiros capítulos da minissérie, transmitidos segunda e terça-feira.

Eu esperava mais. Eu esperava principalmente que o talento de Dalva de Oliveira fosse o centro da microssérie de apenas cinco capítulos.

Mas os dois primeiros se limitaram a mostrar Dalva de Oliveira cantando como participante do Trio de Ouro e a brigar repetidamente com Herivelto, um traindo o outro, não sei que diabo de canção de amor é essa em que se abre um torneio de guampas entre os dois personagens principais.

No meu fanatismo pela voz de Dalva de Oliveira, eu admitia que ela fosse mostrada na minissérie cantando no Trio de Ouro. Mas não tanto, eu queria vê-la cantando sozinha quase todo o tempo, com a finalidade de que o Brasil de hoje conhecesse o estupendo tesouro de sua voz, que todos hoje se assombrassem com o talento de Dalva de Oliveira, até agora não reconhecido.

E eu pensei que com a minissérie o talento de Dalva fosse finalmente reconhecido.

Mas, do jeito que vai, sem termos podido sentir a voz de Dalva nos dois primeiros capítulos, quase desaparecida entre o Trio de Ouro e com a insistência em mostrar a toda hora as brigas entre Dalva e Herivelto, sei lá, mas estou preparado para frustrar-me com o espetáculo.

É possível que nos três últimos capítulos os produtores valorizem a voz de Dalva de Oliveira, mas sozinha, porque foi ela a grande artista do Trio de Ouro.

Herivelto acabou sendo um dos maiores compositores da música brasileira em todos os tempos, mas a arte, o talento na interpretação, estes brotavam de Dalva, cuja voz mais parecia um instrumento musical de tão perfeita e inebriante.

Fico torcendo para que a minissérie corrija o defeito de abordagem e volte todo o seu enfoque para o vulto de Dalva, botando-a a cantar sozinha, deixando-a vibrar aqueles trinados sublimes e envolventes, soltando a sua voz de pássaro trigueiro como nunca existiu igual na música brasileira.

Será que dá ainda para salvar essa minissérie? Talvez dê, é só pensar que Dalva está muito acima do Trio de Ouro e que seu talento de expressão dava de goleada nos dois outros componentes do conjunto.

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