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quinta-feira, 3 de setembro de 2009
03 de setembro de 2009
N° 16083 - ETICIA WIERZCHOWSK
Das nossas esquinas
Sou uma caminhante convicta: com tempo, vou a pé. Gosto de andar por aí levando meu filho mais novo no carrinho e, no bairro, somos conhecidos de toda a gente. Mas tenho voltado para casa cada dia mais contrariada.
Atravessar uma rua, hoje em dia, é quase um esporte radical. Faixas de segurança são uma ilusão na qual já não se pode confiar, e até mesmo carrinhos com lindos bebês sorridentes de nada ajudam: já os motoristas não se enternecem por coisa alguma. O trânsito, todos sabemos, é um bom termômetro para medir a educação de uma gente.
Porém, basta um pequeno passeio pela nossa cidade para que vejamos o quanto somos mal-educados, egoístas, irresponsáveis mesmo: nem na frente das escolas as faixas de pedestres recebem o respeito merecido. Não tem jeito: parar na faixa, só se for para não levar multa do azulzinho de plantão.
Triste realidade que nos espreita diariamente e que é uma faca de dois gumes: mesmo que você seja um motorizado fanático e nem pense em caminhar até a padaria da esquina para comprar pão, impossível viver sem atravessar uma avenida. E, nessa avenida, a prepotência do motorista desconhecido vai estar lhe esperando.
Assim, vivemos mordendo nosso próprio rabo a fim de economizar míseros minutos diários: você passa aquele sinalzinho que avermelhou ainda agora para não perder a hora no dentista e, a algumas quadras dali, seu filho, sua avó ou seu irmão talvez estejam atravessando a rua quando outro apressadinho vai cruzar o sinal antes da hora…
A cidade, símbolo maior da civilização, manancial de confortos e de cultura, se vai transformando numa selva. E tudo isso me fez lembrar de um delicioso livro do Eça de Queiroz, A Cidade e as Serras. Não havia carros motorizados no tempo do Jacinto descrito pelo Eça, e seguia o personagem louvando as maravilhas de viver numa grande metrópole (no caso, compreenda-se, era Paris…).
E dá-lhe modernismos e confortos e isso e aquilo, até que um dia, o riquíssimo Jacinto necessita ir até as serras portuguesas ver uma tal propriedade que tinha ele por lá. Foi cheio de medos: medo do escuro, da ignorância, da falta da convívio social, medo das árvores e dos animais, medo da escassez dos jornais e de médicos.
Foi-se o Jacinto, e nunca mais voltou para Paris. Ficou lá no campo, feliz entre seus pomares, longe da pressa e do bulício da cidade grande.
E cá estou eu, nessa nossa pequena Porto Alegre, sonhando em guiar o carrinho do meu bebê por algum prado em flor e esquecer as ruas onde padeço a antipatia e a pressa alheia, cada vez mais enjoada da fúria da nossas esquinas.
Ainda que com chuva que tenhamos todos um bom dia
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