quinta-feira, 24 de setembro de 2009



24 de setembro de 2009 | N° 16104
RICARDO SILVESTRIN


Jovens, adultos e velhos

Existe um passado à nossa espera. Um passado que nos foi negado sabe-se lá por que razão ou desrazão. Nosso ensino centrado na literatura brasileira é parte disso. Como se o mundo tivesse começado em 1500. Como se só existisse a cultura do nosso país.

A valorização do que é nosso distorce o nosso valor. Não nos vemos em relação aos outros. Só em relação a nós mesmos. Mas não só isso. Há uma excessiva valorização do presente.

Como se o novo fosse o atual. Há muita coisa, a maioria, que nasce hoje e nada mais é do que a repetição da repetição. Mais: nos atocharam que o passado é sisudo, nobre, elevado. Toda essa mediação acaba tirando do horizonte textos que deveríamos ter lido com a mesma naturalidade com que foram escritos.

Por exemplo, Aristóteles na sua Arte Retórica, nos capítulos em que trata sobre os jovens, os adultos e os velhos. Só de se falar o nome Aristóteles já vem um velho grego, filósofo, lido apenas por iniciados. Mas ele nada mais é, nesses capítulos, do que um amigo nosso, próximo, sábio e extremamente contemporâneo.

Não aquela contemporaneidade que se chega traçando paralelos, muitas vezes forçados, entre a antiguidade e os dias de hoje. Aliás, antiguidade é outro nome que não ajuda.

Só serve para parecer que é algo do tempo do epa, ultrapassado. Entretanto, a visão que o filósofo grego nos passa nesses textos é mais do que contemporânea. Vai tão fundo que ultrapassa a noção de época. E ainda nos surpreende quando vemos que a vida é a mesma.

Os problemas humanos não mudam. Tenho percebido que há uma possibilidade de pensamento vertical, que acha as coisas próximas de como são, lá na raiz. Quem traz isso à tona fica. Chamem de clássico ou do nome que quiser. Eu estou chamando de pensamento vertical.

O resumo do que disse Aristóteles, já filtrado e incorporado por mim: o destino de todas as coisas é dar errado. Mas isso a gente só sabe na velhice. Lá vivenciamos na prática e vemos como os amores acabam, o dinheiro que se ganha vai embora facilmente, tudo se relativiza, as conquistas se esboroam, não são mais o que pareciam antes de serem conquistadas.

Na juventude, não se sabe disso. Daí a força, a coragem, a ideia de que é preciso lutar para realizar os planos, para pôr em prática o que idealizamos, a sensação de que se é quase imortal, de que vamos conseguir.

Na idade madura, para Aristóteles aos 49 anos, fazemos o balanço entre a força da juventude e a prudência da visão adulta.

Já vislumbramos que as coisas caminham para acabar e conseguimos ter capacidade de realização temperada pela consciência. Não era pra todo mundo ter lido isso antes dos 20 anos?

Nenhum comentário: