sábado, 3 de janeiro de 2009



03 de janeiro de 2009
N° 15837 - PAULO SANT’ANA | CLÁUDIO BRITO (interino)


Nossas cidades

As posses de quase 6 mil prefeitos e perto de 52 mil vereadores não podem ser vistas apenas como formalidade de pequena significação. Nascemos, vivemos, morreremos e seremos sepultados ou nossas cinzas guardadas em nossos municípios. A vida acontece em nossas cidades.

O Estado e a União são entes jurídicos que não tocamos nem sentimos. Os rios, as montanhas, as ruas e nossas casas estão nas cidades. O município é a célula fundamental de toda a federação, que é uma abstração. Onde está a União? Suas estradas e edifícios públicos são traçadas ou se encravam no território de algum município.

Compramos, vendemos, lucramos ou perdemos nas cidades em que moramos ou nas de quem negocia, vende ou compra de nós. A vida de relação desenvolve-se nas cidades e por conta disso pagam-se impostos. E começa aí a injustiça. O leão é federal, mas alimenta-se do que as cidades geram de situações tributáveis.

O retorno às cidades é menor que o devido, se confrontarmos o que se exige do município em prestação de serviços e o que lhe rende o imposto recolhido. Bem por isso a maioria das cidades não cumpre ainda a municipalização de algumas atividades que a Constituição determina.

É o caso dos órgãos de defesa dos direitos dos consumidores. No Rio Grande do Sul, não chegam a 80 os municípios que já organizaram seus Procons e mesmo Porto Alegre fez isso há pouco tempo. Parecido com o que acontece em áreas mais sensíveis, como a saúde e a educação.

Cobra-se dos prefeitos a correção desse quadro. Defendem-se com argumentos aceitáveis, pois é inegável que são cometidos vários deveres aos municípios, sem o aporte de recursos necessários e suficientes. Tudo por conta de um modelo institucional que valoriza a ideia da municipalização, sem esquecer que a União é faminta e quer cada vez mais impostos.

Assim não dá. O desequilíbrio precisa ser corrigido um dia. Repetem-se as marchas de prefeitos e vereadores sobre Brasília a cada ano, mas ainda não se vê com otimismo o que possam fazer deputados federais e senadores. Melhor dizer que não se vê o que eles queiram realizar, pois, poder eles podem.

Confesso-me um municipalista. Gostaria de experimentar outro desenho institucional, em que se consolidasse o preceito constitucional de valorização do município como ente público de maior relevância.

Serviços essenciais municipalizados, presídios e órgãos de segurança dimensionados ao menos regionalmente, escolas, creches e hospitais logo ali na esquina, com todos os recursos e condições. Viveríamos em melhores condições, tenho certeza.

Mais que nossos mandatários, prefeitos e vereadores são nossos vizinhos. Cuidaríamos das cidades como nossos grandes condomínios, fosse outro o pacto federativo. E teríamos gosto em pagar nossos tributos, pois mais de perto perceberíamos o retorno que se pretende ao pagar algum serviço.

Faço minhas as palavras de Cezar Schirmer, que, no dia da posse, admitiu ser hoje um municipalista convicto para quem “é melhor termos 6 mil grandes prefeitos que um grande presidente”.

Tem razão o novo prefeito de Santa Maria. Há muito está superada a fórmula de governança aos cuidados de um “pai de todos”, por mais competente, bem-intencionado e carismático que seja.

Se a Carta de 88 traçou os parâmetros de uma democracia participativa, melhor que se busque entregar aos municípios a grave missão de fazer o bem comum. Políticas públicas realistas, adequadas, bem dimensionadas, caso a caso, cidade por cidade.

Do conjunto da obra é que faríamos um grande Brasil. Por tudo isso é que assisti às cerimônias de posse dia 1º com muita atenção e dedicada postura de quase solenidade.

Os prefeitos e vereadores merecem mais atenção e consideração e, é claro, devem-nos a contrapartida do mesmo tamanho. E, para nós e para eles, resta um dever: o de lutar pela reestruturação de nossa federação, com a criação de mecanismos que contemplem a municipalização como forma de administração pública mais importante.

Afinal, se tantas vezes foram alterados os rumos brasileiros, por que não se experimentar o que, a rigor, está no coração da Constituição Federal, faltando apenas que sua vontade seja cumprida?

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