sábado, 19 de março de 2022


19 DE MARÇO DE 2022
FLÁVIO TAVARES

O VULCÃO

O dia a dia não é só a sucessão de tragédias que começa na pandemia e chega à invasão da Ucrânia, abrindo caminho à destruição nuclear. Há, também, atos a festejar. Aqui, a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) decidiu arquivar o pedido de licença para cavar uma mina de carvão a céu aberto em terras de banhado à beira do Rio Jacuí, a 14 quilômetros de Porto Alegre.

A Fepam julgou insatisfatórias as alegações sobre a segurança do empreendimento apresentadas pela mineradora Copelmi para abrir a chamada Mina Guaíba. Antes disso, a juíza federal Clarides Rahmeier tinha declarado a "nulidade" do processo de licenciamento. Em 2019, a Fepam pediu novos detalhes sobre a alegada segurança da futura mina, mas a mineradora nada informou.

Limitou-se a alardear que extrairia mais de 166 milhões de toneladas de carvão, 422 milhões de metros cúbicos de areia e 200 milhões de metros cúbicos de cascalho, ocupando 4.373 hectares, equivalente a 4.370 campos de futebol, na maior mina a céu aberto da América Latina, hoje zona agrícola.

O próprio "estudo de impacto ambiental" apresentado pela mineradora, porém, revela que cada explosão liberará 416 quilos de poeira por hora. Em três explosões diárias, nos 23 anos da mina, seriam 30 mil toneladas do terrível material particulado caindo pela redondeza, equivalente a duas bombas atômicas de Hiroshima.

Essas partículas finas, sem cheiro, contêm material pesado, como cádmio, que provoca câncer. Os persistentes ventos espalhariam o material por áreas distantes. Situada em terras de brejo à beira do Rio Jacuí, com as chuvas, em poucos anos, a mina transformaria o Guaíba em um estuário tóxico de águas pestilentas.

Arquivar a licença é um passo adiante, mas não põe fim ao horror. É como um vulcão silencioso, que volta a irromper e destrói tudo. A empresa segue com o "direito" de explorar. Abolido mundo afora, aqui o carvão tem, até, subsídio federal e pode voltar a atacar, como vulcão ativo.

FLÁVIO TAVARES

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