quarta-feira, 23 de setembro de 2020


PEQUENA FALHA, GRANDE ALERTA

ADALMIR ANTONIO MARQUETTI | Professor de Economia da PUCRS

ALESSANDRO DONADIO MIEBACH | Professor de Economia da UFRGS

A recente e confusa divulgação do PIB estadual pelo Departamento de Economia e Estatística (DEE) proporciona uma reflexão sobre o atual contexto de reformas no setor público tanto no âmbito nacional quanto no regional.

O cálculo do PIB gaúcho, descontinuado com o encerramento da Fundação de Economia e Estatística (FEE) e retomado pelo DEE em 2019, é um exemplo de reformas baseadas em concepções superficiais. Como é usual, tais concepções prescindem de análise técnica e conhecimento científico, gerando resultados negativos para a sociedade.

O plano original de terceirização do cálculo do PIB revelou-se frustrado. O motivo pode ser constatado ao se compararem as estimativas terceirizadas e o cálculo do DEE. Tal comparação revela diferenças significativas, sendo o caso mais expressivo localizado na agricultura, setor relevante na economia gaúcha.

Cabe recordar que, quando da proposta de fechamento da FEE, a academia e economistas de todos os espectros teóricos alertaram sobre as consequências negativas de tal iniciativa. Entretanto, o descaso com o rigor analítico gerou a necessidade de se reinventar a roda.

Ainda assim, a elogiável iniciativa do governo estadual de retomar a estimativa do PIB esbarra em riscos como o episódio recente de suspensão da divulgação por ordem da secretaria de Estado que subordina o DEE. Apesar de tratar-se de episódio menor, ele indica a falta de autonomia para quem elabora dados com o potencial de incomodar os detentores do poder. A pandemia nos lembrou que dados confiáveis e imunes a interferências são vitais às sociedades modernas. Fica claro que o governo do Estado deve converter a iniciativa de recuperar a produção de estatísticas em uma política de Estado, criando um órgão autônomo. Tal órgão pode ser estabelecido sem custo adicional para as finanças públicas, dado que todos os recursos necessários para tanto, inclusive humanos, encontram-se internalizados na estrutura do Estado.

No momento em que diversas reformas são propostas de maneira assoberbada e orientadas por noções simplistas, é fundamental termos presente que ao abdicar do conhecimento, uma sociedade está condenada a cometer equívocos e a não construir soluções.

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