terça-feira, 29 de setembro de 2020


29 DE SETEMBRO DE 2020
NILSON SOUZA

Fratelli tutti? 

Leio que o papa Francisco lançará sua terceira encíclica no próximo dia 3 de outubro, data em que também celebrará uma missa nas proximidades do túmulo de São Francisco, em Assis. Inspirado no santo do desapego e do amor à natureza, de quem adotou o nome quando foi escolhido para liderar a Igreja Católica, o pontífice argentino aproveitou o isolamento da pandemia para escrever sobre o que chama de "globalização da solidariedade" - na sua visão, o rumo necessário para a superação da crise por que passa a humanidade.

- Quantas divisões tem o Papa? - perguntarão incrédulos e céticos como este escriba, repetindo o histórico e debochado questionamento de Stalin.

Não há dúvida de que a análise papal é coerente e bem-intencionada: em princípio, o vírus fulminante está mostrando que somos todos iguais, independentemente de nacionalidade, raça, crença religiosa e posição política, ainda que, lamentavelmente para os grisalhos, pareça ter predileção por determinada faixa etária. Também acho que estamos todos no mesmo barco, como argumenta o Papa. Mas daí a crer que remaremos juntos para um porto seguro, e que sairemos "todos irmãos" desta aventura dolorosa, me parece, com todo o respeito à Sua Santidade, uma santa ingenuidade.

- Ele não é ingênuo, é idealista - me socorre o amigo Armindo Trevisan, com sua erudita paciência. Conhecedor profundo das coisas da Igreja, ele me esclarece que Francisco é um evangelizador e que usa a palavra como arma de persuasão em massa. Porém, pressionado pela minha desconfiança, o poeta reconhece que o mundo já passou por crises semelhantes ou até piores, como guerras, escravidões e holocaustos, sem que se notasse uma evolução coletiva do ser humano. Ainda assim, meu conselheiro faz questão de dizer que crê no poder da oração.

Oremos, então, para que pelo menos uma parcela da tribo humana saia mais consciente e solidária deste momento aflitivo que estamos vivendo.

Duvido da nossa espécie, mas também torço pelo vaticínio do hermano célebre. Uma vez perguntaram para Caetano Veloso se ele acreditava em Deus. Ele respondeu com ironia e inteligência:

- O Gil acredita em Deus. E eu acredito no Gil.

Pois eu também acredito no Armindo Trevisan.

O município de Restinga Seca, na região central do Estado, perdeu um morador de estimação na madrugada de ontem. O cão Bidu morreu aos 13 anos por problemas cardíacos e também pela idade.

Bidu ficou conhecido por ajudar na oficina de seu dono, o mecânico Ernesto Schwert, buscando ferramentas e fazendo outras tarefas. Por causa dessas habilidades, passou a ser chamado nas redondezas de "cão mecânico". Depois, o prendado animal ganhou a companhia de Diana, sua irmã, e Fritzz, seu filho.

O trio de parceiros de Ernesto foi tema de diferentes reportagens, tanto em programas de televisão quanto em veículos de imprensa, a exemplo de GZH - e até mesmo fora do Brasil.

Os cães habilidosos inclusive atraem visitantes para a oficina de seu dono. Envolvido com a comunidade, ele aproveita para deixar uma caixinha para gorjetas, que todos os anos são destinadas à Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) de Restinga Seca.

No perfil de Ernesto em uma rede social, há diversas manifestações de carinho e de luto pela morte do cão, que é uma mistura de rottweiler com golden retriever. Ontem, o mecânico faria uma cerimônia para a família se despedir do amigo de mais de uma década. Depois, o cão seria sepultado no jardim da residência onde morava.

Em reportagem de GZH publicada em janeiro de 2019, Ernesto explicou como desenvolveu um técnica para estabelecer conexão massageando o umbigo dos cachorros. Foi assim que se deu a sua aproximação com Bidu:

- É o primeiro passo de uma grande conquista. Aí, pode começar a pedir tarefas que ele faz por você. É emocionante.

NÍLSON SOUZA

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