quarta-feira, 23 de setembro de 2020


23 DE SETEMBRO DE 2020
OPINIÃO DA RBS

RESISTÊNCIA A REFORMAS 

A decisão do Palácio Piratini de retirar de tramitação na Assembleia os três projetos que formavam a proposta de reforma tributária do governo Eduardo Leite, diante de uma derrota iminente, é mais uma das límpidas evidências do quanto é árduo aprovar mudanças mais profundas no Rio Grande do Sul. Mesmo diante de adversidades graves e crônicas que não podem mais ser jogadas para as calendas, como um sistema de impostos injusto e que serve de trava ao desenvolvimento, as resistências são enormes.

O debate que demonstrou oposição à reforma - que previa uma defensável desoneração do consumo compensando-a com maior taxação sobre patrimônio - combina boas intenções com negação da realidade, discursos demagógicos e eleitoreiros ou superficiais, como aqueles que apontam os problemas mas não fazem a menor ideia de como tirar o Estado da crise. Tão prejudicial quanto pseudoalternativas francamente inexequíveis é a postura de lavar as mãos à espera de uma saída extraordinária que faça milagrosamente o Estado se recuperar da crise fiscal e econômica sem que haja uma distribuição de sacrifícios entre todos. Sem essa compreensão, os danos a longo prazo para o Rio Grande do Sul serão ainda maiores. As argumentações que esvaziaram a reforma tributária evidenciaram outra vez que o Rio Grande do Sul dispõe de incontáveis especialistas em diagnósticos, mas escassos líderes capazes de colocar à mesa opções praticáveis e realistas para curar a doença das contas públicas que paralisa o Estado.

Uma solução verdadeira possível para dar mais competitividade à economia gaúcha, fazer justiça e equilibrar as colunas de despesa e receita, permitindo uma volta sustentável aos salários em dia e investimentos condizentes em infraestrutura, saúde, educação e segurança por certo não será feita com medidas fáceis. Naturalmente vai demandar uma profunda reestruturação de órgãos e funcionalismo dos três poderes. Mas, depois de o Piratini conseguir aprovar no início deste ano uma reforma administrativa minimamente aceitável, vitoriosa com grandes dificuldades, é uma quimera imaginar que, sem uma iniciativa de larga envergadura no âmbito federal, a Assembleia Legislativa possa dar vazão a mudanças radicais na estrutura estadual. É preciso levar em conta ainda o maior peso dos inativos na folha de pagamento, um nó difícil de ser desatado sem saídas pouco palatáveis, como um aumento significativo das alíquotas de contribuição previdenciária.

A reforma tributária encaminhada pelo Piratini exigia algum sacrifício, mas continha uma lógica aceitável - fazer as alíquotas de ICMS retornarem aos patamares de 2015, elevar alguns impostos aos níveis de outros Estados e, sobretudo, uma inventiva devolução de recursos às camadas mais desprotegidas da sociedade e, proporcionalmente à renda, as que mais pagam tributos. No todo, não havia aumento da carga, mas um pouco mais de justiça na distribuição do peso dos impostos. Ainda assim, como um prenúncio das dificuldades que serão enfrentadas pela reforma tributária em nível federal, a discussão foi esvaziada e voltou à estaca zero.

O Estado avançou positivamente nos últimos anos com a aprovação da extinção de fundações, de algumas privatizações, com uma minirreforma administrativa e mudanças na previdência. Mas são passos pequenos diante da profundidade da crise. Sem a compreensão das várias forças envolvidas de que não há saída fácil e de que em algum momento todos devem abrir mãos de benefícios e privilégios incompatíveis com a inegável falência pública, mais algumas gerações de gaúchos seguirão travadas pela eterna disputa política e falta de consenso em torno dos grande problemas do Rio Grande do Sul.

 

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