terça-feira, 15 de setembro de 2020


15 DE SETEMBRO DE 2020
NILSON SOUZA

A primeira telinha


A televisão brasileira completará 70 anos nesta semana para o Lima Duarte e, talvez, para algum outro raro cidadão longevo que teve o privilégio de ser testemunha ocular da história. Para a maioria de nós, os duzentos e tantos milhões ainda em ação, ela chegou bem depois do seu lançamento em São Paulo por Assis Chateaubriand, em setembro de 1950. Ninguém tinha receptores. Aliás, para a primeira transmissão se concretizar, o próprio empresário teve que importar 200 aparelhos e colocá-los em lugares movimentados da cidade.

No Brasil profundo, a televisão chegou muitos anos depois da sua inauguração, mas não deixou de ser um deslumbramento para os nativos da era do rádio. Essa transição eu testemunhei. Os da minha infância passávamos horas de ouvido colado num aparelho a válvula, que mais assobiava do que falava, mas não perdíamos um só capítulo de O Mágico de Oz radiofonizado, da mesma forma como os adultos ouviam o Repórter Esso (eles) e a novela O Direito de Nascer (elas).

O rádio nos fazia sonhar com terras encantadas, com pessoas especiais e com acontecimentos extraordinários, até mesmo quando transmitia a realidade. Tinha tanto poder e magia, que podia até confundir o cérebro humano:

- A CBS interrompe seu programa para anunciar aos ouvintes que um meteoro de grandes dimensões caiu em Grovers Hill, no Estado de Nova Jersey, a algumas milhas de Nova York.

Essa criativa fake news deu início à célebre Guerra dos Mundos, uma ficção sobre a invasão da Terra por marcianos que acabou provocando histeria e pânico em parcela expressiva da população norte-americana.

Na era do rádio, a imaginação era a rainha.

Aí surgiu o aparelho que levou a magia do cinema para a sala das casas. A primeira vez que o vi foi na condição de televizinho do único morador do bairro que possuía uma pequena tevê preto e branco, com imagem chuviscosa e bombril na antena. Fazíamos fila no final da tarde diante da casa do homem e lá ficávamos até que o comercial dos cobertores Parahyba nos dissesse que era hora de dormir.

Jamais imaginaríamos que as telinhas ganhariam cores, novas dimensões e múltiplas atrações, até se transformarem no feitiço tecnológico do admirável mundo novo destes tempos virtuais e pandêmicos. Com telas luminosas por todos os lados, a aniversariante septuagenária já não impera sozinha, mas ainda mantém um certo brilho hipnótico.

NÍLSON SOUZA

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