sexta-feira, 18 de setembro de 2020


 18 DE SETEMBRO DE 2020
DAVID COIMBRA

Os que se acham grandes para tarefas pequenas 

Todos os dias tenho que dizer para o meu filho escovar os dentes. Todas as noites tenho que dizer a ele para ir para a cama. Todos os finais de tarde tenho que mandá-lo tomar banho. É assim que é. O pai deve cuidar sempre.

Natural, isso. Certas atividades, se você não as sente como obrigações ou se alguém não o incita a cumpri-las, volta e meia você deixa de fazê-las. Exercícios físicos. Eu os faria com mais frequência, se tivesse a idade do meu filho e minha mãe ficasse me incomodando:

"Está na hora da academia!"

Mas, como sou eu mesmo que decido o que fazer com meu tempo, não vou à academia. Nem me matriculei na academia, para falar a verdade.

As mulheres, de certa forma, assumem esse papel de consciência externa, porque elas sempre acham que sabem o que é melhor para você. Às vezes, inclusive, elas têm razão.

É aquilo que Thomas Jefferson falava: "O preço da liberdade é a eterna vigilância". Ele estava certo. Só que esse preço não é cobrado apenas pela liberdade. Muitas coisas custam a eterna vigilância, o que é uma chatice e, volta e meia, parece inútil. Por que é que preciso arrumar a cama de manhã, se vou desarrumá-la à noite?

Se você quiser ter bom sucesso em algum empreendimento, é necessário despender ainda mais atenção a certos cuidados diários. Você se concentra e se esforça para atingir uma posição. Depois de alcançá-la, não poderá relaxar. Ao contrário: terá que ficar ainda mais atento, ou a queda virá inevitavelmente. A vitória está na humildade de repetir as tarefas aborrecidas do dia a dia. A derrota está na crença de que se é grande demais para fazer coisas pequenas.

Como ensina a Bíblia, "a soberba precede a ruína, a arrogância vem antes da queda".

O Grêmio de Romildo e Renato atingiu uma posição elevada, e isso aconteceu graças à competência e ao esforço dos dois e do grupo que lideravam. Mas, aos poucos, eles foram relaxando, talvez por acreditar que o que já haviam feito bastava para garantir o sucesso. Trata-se de um grande erro. O sucesso tem de ser construído a cada hora. Sem pausa, sem descanso, sem distração.

O Grêmio montou um time superior em 2016 e 2017. Nos dois anos seguintes, o rendimento já não foi o mesmo, mas alguns resultados positivos foram obtidos porque havia uma base de talentos. No ano passado, o fracasso rotundo diante do Athletico Paranaense e o fiasco diante do Flamengo deveriam ter sido suficientes para indicar a necessidade de mudanças profundas. As mudanças foram perfunctórias, e os problemas se agravaram. Neste ano, o Grêmio foi campeão gaúcho porque tinha Kannemann, Geromel, Maicon e Jean Pyerre em boas condições físicas e, sobretudo, porque tinha Everton.

No próximo Gre-Nal, o Grêmio não os terá. A tendência é de que seja amassado pelo mais bem preparado e mais concentrado time do Inter. Porque o Grêmio, ao contrário, está caindo aos pedaços. Está desarticulado, confuso e desanimado. Os jogadores não têm força e disposição para conter o adversário, não conseguem retomar a bola, não conseguem concatenar as ações em campo. Porque o time está mal treinado e mal condicionado. Porque houve relaxamento. Houve descuido da vigilância. E a vigilância, nós sabemos, tem de ser eterna.

DAVID COIMBRA

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