RUTH
DE AQUINO
04/06/2015
- 20h56 - Atualizado 04/06/2015 20h56
Homofóbicos,
saiam do armário!
O
anúncio causou tanta ira porque não há bichas nem sapatas. Mostra casais gays
felizes. E normais!
Toda
forma de pensar vale a pena. Eu curto. O que seria de nós – namorados ou
solitários, héteros ou gays – se não existissem pastores evangélicos como Silas
Malafaia, que em vídeo exorta o Brasil a apoiar “a família milenar” e a só
acreditar nos casais de “macho e fêmea”? É isso aí, Malafaia, bota esse ódio
todo para fora! Espume pela boca seu preconceito, rebole seu medo. Eu apoio.
Pastor
Malafaia, lidere um movimento claro e aberto contra essa “libertinagem” de cada
um amar quem quiser, onde já se viu? Faça vir à luz todos aqueles que, no
íntimo ou em público, encaram a homossexualidade como aberração e doença. Os
homofóbicos ainda são muitos e enrustidos. Andam meio ocultos no armário. Não pode.
A hipocrisia é o mais difícil e insidioso inimigo a combater.
Pastor
Malafaia e seus seguidores, tentem de verdade boicotar o perfume do Boticário
no Dia dos Namorados. Por que só 30 pessoas acharam o anúncio “imoral” e
pediram que se tire do ar? O anúncio é “chocante”. Ele mostra a ternura (nada
de sexo, nem beijo de língua, nem mesmo selinho) entre casais gays e héteros,
que trocam presentes no dia 12 de junho. O Boticário diz que só aposta na
“beleza das relações”. Não poderia ter garoto-propaganda mais eficaz que o
pastor.
Às
vésperas da 19ª Parada Gay em São Paulo, que parecia abafada pelas indecências
dos escândalos, as redes sociais foram invadidas por vociferações e borrifadas
do pecado. De um lado, pastores evangélicos e suas ovelhas. Do outro, ativistas
gays e seus simpatizantes.
Malafaia
postou um vídeo cheio de indignação viril: “Quero conclamar as pessoas de bem a
boicotar os produtos dessas empresas como o Boticário. Vai vender perfume para
gay!”. O pastor convoca o país a dizer não a “essa gama de empresas que fazem
propaganda da relação gay”, “tentando ensinar a crianças e jovens o
homossexualismo”.
O
pastor não acredita, seriamente, que perfumes ou novelas possam transformar um
hétero em gay ou vice-versa, não? Vídeos hilariantes foram criados nas redes:
um carro do Boticário borrifa perfume na população de várias cidades do mundo e
o fumacê “contamina as famílias”. Olhei, ri e pensei. É o vírus do dengo. A
epidemia da frescura. Não há antídoto.
“Tenho
o direito de preservar macho e fêmea!”, grita Malafaia. “Nós somos a maioria!”
O pastor diz que fica rindo contra “esses pseudos-democratas (sic)” que o
atacam. Malafaia tem razão ao protestar “contra a ditadura do consenso” –
ninguém é obrigado a pensar ou sentir como os outros. O pastor também presta um
serviço valioso à causa dos gays e lésbicas. Porque desnuda a fraqueza dos
argumentos do Estatuto da Família. Como assim só considerar “núcleo familiar” o
composto por homem, mulher e sua prole? Alô, realidade. Há mães e pais e filhos
abandonados, há mães solteiras e viúvas que criam sozinhas seus filhos, há avós
que criam os netos, há famílias ampliadas com pais e mães emprestados. O pastor
vive numa ilha da fantasia, mas tem esse direito.
Os
comentários anônimos e sob nomes fictícios na internet, a favor de Malafaia,
revelam que o pastor não está sozinho. O ódio, o rancor, o receio diante do
“diferente” existe, é forte, e só quando for expresso sem freios poderá ser
combatido. E até ser enquadrado como crime de expressão. Hoje, incitar ao
racismo é crime. Um dia, incitar ao ódio contra o homossexual também poderá ser
crime – e já é em vários países.
Acho
um equívoco gays influentes chamarem o pastor Malafaia de “filho da p...” ou
coisa parecida, numa forma rastaquera de militância raivosa. É um erro tentar
silenciá-lo. É preciso, nas críticas ao pastor e seu exército, guardar a
compostura e não perder a linha. São eles os censores e não nós. Vamos lutar
com as armas legítimas, a argumentação, o amor, a dignidade e a verdade. E com
o humor inteligente e de bom gosto, aliado de causas como esta: “Toda forma de
amar vale a pena”.
Reveja
o anúncio do Boticário. O que existe ali de “imoral” para ir a julgamento do
Conar – órgão que regulamenta a publicidade? Por que o anúncio desse perfume despertou
a ira dos homofóbicos? É simples: a mensagem breve, sem fru-fru, é de
felicidade. Carinho. Abraço. Normalidade (aargh!). Gentileza. Emoção. Sedução
sutil. Paridade entre os héteros e os gays. O comportamento amoroso é igual,
não há nada pernicioso, promíscuo ou selvagem. Eles e elas se arrumam, com
brilho nos olhos, para ir à casa de seu par e dar um presente.
O
anúncio choca o pastor Malafaia porque não há “bichas” nem “sapatas”. Não há
estereótipos ou caricaturas de gays. Por isso, tirem as crianças da sala!
Sinceramente, pastor, quem é o bicho-papão da história e onde está o tesouro do
arco-íris?
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