06 de fevereiro de 2014
| N° 17696
L.F. VERISSIMO
Sob o edredom
George Orwell não foi, afinal, um
mau profeta, foi apenas um profeta apressado. A sociedade controlada por um Big
Brother que tudo vê e tudo sabe, que Orwell previu para 1984, só começou a
existir, com os avanços da bisbilhotice eletrônica, há pouco tempo.
Hoje
sabemos que tudo o que mandamos por e-mail ou falamos pelo telefone, mesmo que
seja apenas notícia do furúnculo da vovó, pode estar sendo monitorado. Os
americanos, principalmente, têm os meios para nos controlar completamente, todo
o tempo, dia e noite. Não é mais o Big Brother, mas o Big Uncle, o grande tio
do Norte, de olho em todos nós.
No livro de Orwell, uma das
funções do Big Brother é a de impedir o amor entre os cidadãos. O sexo tem que
ser escondido, e é quase impossível esconder-se dos olhos do grande
controlador. O que torna irônico o significado que “Big Brother” adquiriu com o
tempo, como sigla de TV, em todo o mundo.
Um dos atrativos do programa é o
prazer do voyeurismo, o de ver o que acontece quando jovens dos dois sexos, e
às vezes de três, são reunidos num clima de sensualidade exposta, e o sexo é
tacitamente permitido, desde que embaixo do edredom. A distopia de Orwell, do
Estado onipresente, até na cama, se transformou na utopia do sexo sem
restrição, em que, em vez de se esconder das câmeras, os competidores as
procuram, para aparecer mais.
O Big Uncle não deve se
interessar pelo que fazemos sob o edredom. A minha vida sexual eu tenho certeza
de que não causa nenhum frisson em Washington. Mas em todos os outros sentidos,
a profecia de Orwell foi confirmada. 1984 finalmente chegou.
O beijo
Não sei se é verdade, mas ouvi
que a discussão, na Globo, sobre autorizar ou não o beijo gay na novela foi
mais longa e difícil do que se imagina. Havia duas facções: a que defendia
beijo de língua e a que só aceitava boca fechada. Só na última, tormentosa,
reunião ficou decidido: boca fechada. O Brasil ainda não está pronto para a
língua.
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