segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014


03 de fevereiro de 2014 | N° 17693
ARTIGOS - Paulo Brossard*

D’aquém e d’além-mar

Ninguém pode negar que a eleição do líder do PT para chefia da nação teve repercussão até internacional. Em pouco tempo, um partido nascia, conquistava o Planalto e desfrutava a Presidência da República. Anunciava-se uma mudança no estilo de governar, embora nenhuma medida chegasse a ser enunciada. Não estranha que a expectativa entrasse a mermar, pois o partido que se laureara com a posse das chaves do Planalto, do Alvorada e da Granja do Torto, exagerava no estéril personalismo. Enfim, o novo partido não era um partido novo.

Com efeito, o atual governo transcendeu a tudo o que se vira. O autoelogio diário, insistentemente repetido nos meios de comunicação, em particular pela televisão, pouco falta para atribuir a majestade à pessoa da presidente da República. Chega a ser deprimente.

O caso do mensalão, que ainda não foi digerido, começou com um pedido de desculpas, após com a negativa do fato, depois com a defesa dos envolvidos e por fim a maioria deles condenados, pela mais alta Corte de Justiça da nação, ao cabo de processo regular e minucioso. Com pompa e circunstância, foi anunciado que o próprio presidente Luiz Inácio iniciaria uma campanha impugnando a condenação, ao mesmo tempo igual cruzada de cunho nacional seria patrocinada pelo ex-ministro José Dirceu. O anúncio, porém, ficou no anúncio. Ninguém levantou a bandeira projetada e o mensalão ficou insepulto. Era natural, para não dizer inevitável, o desconforto público em que o partido do “Novo Estilo” mergulhou.

Eis senão quando nada menos que o presidente nacional do PT fez declarações segundo as quais, “a sigla está cada vez mais afastada das organizações populares, que serviram de base para a fundação do PT há três décadas”. E, na primeira reunião do ano, os novos integrantes da executiva nacional pediram “um programa de modo a corresponder às aspirações, reivindicações, sonhos e expectativas de mudança da população”. Como se vê, o comando nacional não diz ao que veio, antes pede a alguém “programa capaz de satisfazer as aspirações da nação”. Quem? “Alguém.”

Enquanto isso, a senhora presidente emprega todas as suas horas para, remanejando o ministério, e com amplos recursos da Presidência, somar mais um minuto ou um fragmento de minuto para que tenha o domínio da televisão na fase eleitoral. De outro lado, em sua oração de fim de ano, assoalhou ter dominado a inflação e logo no começo de janeiro uma sucessão de fatos revelou o que, aliás, era notório, a inflação não fora sequer mantida no nível anterior; o presidente do Banco Central, não podendo repetir a presidente, recorreu a um circunlóquio ao dizer que a inflação mostrou “resistência ligeiramente acima daquela que se antecipava!”.

Outrossim, os fatos que estão a ocorrer no dia a dia, com as greves em curso e as anunciadas, retratam o suposto bom sucesso do combate à inflação, também festejado pela senhora presidente em sua oração de fim de ano.

Por derradeiro, o que vem de ocorrer em Portugal é penoso e deixa visíveis os critérios vigentes. Publicamente contestada a versão oficial, o governo se apressa em dizer que dá o assunto como encerrado. Virou segredo de Estado; segundo o governo lusitano, a parada em Lisboa estava confirmada desde o dia 23, enquanto a assessoria local menciona 25, permanecendo em Portugal sábado e domingo em razão de uma “parada técnica”. Hospedagem nos hotéis Ritz e Tívoli. Dois aviões, mais de 30 apartamentos. De outra feita, a presidente interrompeu voo para almoçar no Porto. Desta vez, o jantar foi no Eleven, o restaurante mais refinado de Lisboa. Tudo bem, em ordem “republicana”, como se diz agora.


*JURISTA, MINISTRO APOSENTADO DO STF

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