quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012



02 de fevereiro de 2012 | N° 16967
PAULO SANT’ANA


Os tristes e desenganados

Tenho profunda pena das pessoas que sofrem. Não me refiro às pessoas que sofrem eventualmente.

A compaixão que tenho é das pessoas que sofrem sempre, das pessoas desiludidas, dos que não têm mais esperança, daqueles para quem a vida não sorri nunca.

Em suma, tenho pena das pessoas que todas as manhãs acordam para um pesadelo.

Elas têm certeza de que, ao despertar pela manhã, serão mais uma vez assaltadas pela adversidade dos seus dias vazios e insossos.

Há pessoas até que têm tanto terror de acordar pela manhã e com isso se defrontarem com seu sofrimento sem solução, que, quando pela bexiga são acordadas na madrugada, sentem alegria por terem ainda duas ou três horas para dormir e falta ainda esse tempo para não toparem com o pavor de acordar pela manhã e terem de bater novamente contra os rochedos duros da desilusão.

São milhões de pessoas cuja vida não tem mais solução, seja pelos salários miseráveis que recebem, seja pelas encrencas familiares que vivem e que as colocaram em um beco sem saída, seja por outros tantos motivos que tornam a vida infértil, triste, desenganadora, irreversivelmente maldita.

Tenho pena profunda das pessoas desvalidas, dos que não têm e nunca mais terão horizontes em suas vidas. Não pode haver desgraça maior do que ter de acordar-se pela manhã e manter a certeza de que a vida continuará inútil, fútil, amassante e desesperadora.

Essas multidões de pessoas tontas, sem direção, sem alegrias, sem nada ou ninguém que possa emprestar um sentido digno para suas vidas, essas pessoas me causam comiseração.

São farrapos humanos que já se acostumaram com o infortúnio, vivem vegetativamente, são pessoas absolutamente secundárias no cenário dos atores da vida que, se não têm sucesso na existência, pelo menos lutam pelo êxito, agasalham-se na esperança de dias melhores.

Pobres árvores secas da genealogia humana, ninguém lhes dá nem presta atenção, são personagens desintegrados do tecido social, vivem à margem da civilização e pertencem ao que se pode chamar de monturo da vida sensitiva da cidade.

Ah, como eu tenho pena das pessoas inapelavelmente condenadas a serem infelizes!

Ah, como me doem no coração as suas tristezas, os seus olhos sem brilho, as suas cervizes tombadas pelos fracassos e pelos desenganos.

Elas já se acostumaram tanto à infelicidade, que não têm mais forças sequer para soluçar.

Elas vivem à espera da morte sem coragem mínima para se suicidar.

Não posso desconhecer a sorte dessas pessoas e por não desconhecê-la é que minha vida quase também não tem possibilidade de ser conscienciosamente exitosa em face de tamanha iniquidade.

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