sábado, 25 de fevereiro de 2012



25 de fevereiro de 2012 | N° 16990
PAULO SANT’ANA


Escrever todos os dias

Eu não sei se os leitores de Zero Hora já se aperceberam da diferença básica que existe entre mim e vários outros colunistas deste jornal: é que eu escrevo todos os dias e eles escrevem uma ou duas vezes por semana.

Por escrever todos os dias, é que eu já tenho 16 mil colunas nos últimos 40 anos.

Cada coluna que vou escrever corresponde a uma angústia diária: sobre o que irei escrever?

Sendo assim, tenho mais angústias, mas em compensação tenho mais prazeres: o prazer eu sinto quando escrevo uma boa ou ótima coluna.

O Tulio Milman, que também escreve todos os dias, me perguntou a respeito ontem: se eu percebo, antes de ser publicada, que minha coluna será boa no dia seguinte?

Respondi a ele que por vezes percebo que minha coluna será boa, mas há outras vezes que só vejo que ela foi boa depois da repercussão que ela obteve.

Se escrevo mais vezes que os outros, tenho mais chances de me quebrar que os outros.

Em compensação, tenho mais chances de me consagrar que os outros.

Ou será que não? Ou será que, escrevendo todos os dias, as chances que tenho de me quebrar são muito maiores do que as chances de me consagrar?

Acontece que, escrevendo todos os dias, não posso nunca me furtar de escrever, cada dia que passa tem de corresponder a um assunto que eu aborde, não posso, assim, escolher assuntos melhores nos dias intervalares. Rasgou a folhinha e mais uma coluna terá de estar pronta.

Não tem erro, cada dia tem de corresponder a uma coluna. Não tem escape. Raiou o sol e lá vem outra coluna.

Sinceramente, não sei como pude escrever 16 mil colunas neste jornal.

Mas o meu maior feito a este respeito se deu recentemente: tive câncer na rinofaringe. E não deixei de escrever nenhuma coluna durante meu câncer.

E mais: fiz durante 50 dias tratamento cruciante de radioterapia para meu câncer. E durante os 50 dias nunca deixou de ser escrita minha coluna. Isto foi realmente um feito de que me orgulho.

Não sei como pude, durante a radioterapia, escrever todos os dias. E, modéstia à parte, escrever com qualidade.

Deus me fez resistente.

Por que escrevi durante a excruciante radioterapia? Só agora percebo que escrevi durante esse espinhoso tempo porque, se não escrevesse, não suportaria a radioterapia.

Ou seja, sucumbiria à radioterapia se abrisse a coluna e lesse um interino na minha coluna.

Só agora vejo e percebo que um interino na minha coluna é um mal maior do que o câncer.

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