terça-feira, 21 de fevereiro de 2012



21 de fevereiro de 2012 | N° 16986
CLÁUDIO MORENO


Sinais

E você acredita, leitor, que é possível saber o que o futuro nos reserva? Pois todos os povos da Antiguidade, de um jeito ou de outro, acreditavam – e levavam isso muito a sério. Para eles, a janela para espiar o futuro estava na interpretação adequada dos sinais que algum deus enviava cá para baixo, como recompensa para seus seguidores mais devotos.

Como era de esperar – considerando quem eram os ilustres remetentes -, o primeiro lugar onde procuraram estes sinais foi o céu, o que tornou o homem antigo um grande observador dos fenômenos do firmamento. Raios, relâmpagos e trovões, cometas, eclipses e arcos-íris, tudo podia encerrar um significado oculto, importante para tomar uma decisão ou prever aquilo que estava por vir.

Depois voltaram-se para as aves, mensageiras naturais entre os dois mundos - e o voo das águias de Zeus e dos falcões de Apolo, a direção imprevisível dos bandos de abutres no céu, o pio da coruja e o canto da cotovia tornaram-se objeto de estudo de uma verdadeira ciência de adivinhação.

Vieram em seguida os especialistas em ler a trajetória da fumaça que subia do altar dos sacrifícios, a conformação do fígado dos animais abatidos e outras insignificâncias do gênero. Você ficaria espantado, leitor, se soubesse quantas batalhas Roma adiou simplesmente porque as galinhas sagradas se recusaram a comer os grãos oferecidos pelos sacerdotes!

Até hoje há muita gente que toma o acidental e o imprevisto como um sinal, uma manifestação sensível de um mundo além do nosso. Não os condeno, nem aprovo – cada um enxerga o que quer num céu cheio de estrelas.

Só estranho que não vejam que o normal, o de sempre, o familiar também pode ser sinal de algo, talvez bem mais importante. Pessoas que são capazes de ler a configuração das folhas de chá ou a ordem caprichosa com que as cartas saem do baralho, que podem ver o destino da Babilônia traçado nas entranhas de um cabrito, como diria Borges, não conseguem encontrar sentido algum no que está bem na sua frente...

Lacarrière conta que, ao viajar a pé pela Grécia, teve uma verdadeira iluminação: de repente, do nada, sentiu-se parte de um todo – as árvores, o som claro e distinto de um galho que se quebrava, as vozes dos camponeses, cujas palavras mal conseguia distinguir à distância.

Então, “como a luz que se extingue entre as árvores ao anoitecer”, esse “algo” foi sumindo e a tarde se tornou apenas uma bela tarde como as outras. O sinal, porém, era muito claro, a lembrar que o homem e o mundo, mesmo que por instantes, podem formar um conjunto perfeito, indissolúvel, sem outro significado além do eterno fluxo da vida.

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