sábado, 18 de fevereiro de 2012



18 de fevereiro de 2012 | N° 16983
NILSON SOUZA


Irmãos, hermanos

Há algo de nobre nesta história do homem que trocou de lugar com seu irmão na Penitenciária de Charqueadas. Sei que os dois têm ficha sujíssima e que pode parecer um disparate pegar o tema pelo lado da virtude. Também não duvido de que a troca possa ter sido motivada por interesses recíprocos, mediante pagamento. Vá saber... Ainda assim, prefiro pensar no improvável sentimento da fraternidade.

Por um irmão, a gente faz coisas impensáveis. Por irmãos consanguíneos, evidentemente. Desenvolvemos afeto também por pessoas de fora da família – e logo dizemos que o amigo ou a amiga é como um irmão. A não ser em casos de espíritos excepcionais, como São Francisco de Assis, Mahatma Gandhi e Madre Teresa de Calcutá, estamos ainda longe do estado de elevação de considerarmos um javanês, por exemplo, nosso irmão.

E no entanto, do ponto de vista cósmico ou teosófico, somos todos filhos da mesma mãe Natureza e do mesmo Pai Nosso que estais no céu.

Os argentinos, por exemplo. Mais difícil do que admitir o javanês como familiar é olhar com carinho e tolerância para o vizinho de apartamento ou de fronteira. Faz tempo que os tratamos de “hermanos”, mas sempre com muuuita ironia e desconfiança. E os miseráveis ainda usam aqueles cabelos compridões, que encantam nossas mulheres, e produzem um Maradona e um Messi, para abalar a nossa segurança de que, ao menos no futebol, somos superiores a eles.

O Gonza, por exemplo. É um artista aqui da casa, grandão, com pinta de galã e muito talentoso no seu ofício de caricaturar personalidades. No futebol, é meio troglodita, mas no relacionamento diário é um doce, uma criatura realmente agradável. Às vezes, dá vontade de chamá-lo de irmão. Mas aí a gente vê mulheres da Redação suspirando quando ele passa e já dá vontade de invadir Paso de los Libres para expulsar os castelhanos das proximidades.

Claro que estou brincando. Na verdade, as sucessivas crises econômicas dos dois lados da fronteira têm ampliado o sentimento de fraternidade entre brasileiros e argentinos. Ora somos nós que invadimos a Calle Florida, ora são eles que ocupam as praias catarinenses. Cada vez mais nos entendemos melhor.

Mesmo no futebol. Os clubes brasileiros estão cheios de argentinos. O Internacional, neste momento, é o mais argentino dos clubes brasileiros. Chegou a contratar mais de um para a mesma posição. Isso, evidentemente, nos aproxima dos patrícios de Jorge Luis Borges. Mas ainda vamos levar algumas décadas para superar o ranço fronteiriço e chamá-los de irmãos em português.

Além disso, tenho sérias suspeitas de que o Messi, na verdade, é catalão.

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