segunda-feira, 12 de dezembro de 2011



12 de dezembro de 2011 | N° 16915
PAULO SANT’ANA


O Juízo Final

Quando eu tinha 8, 10, 12 anos de idade, nunca me ocorreu, em nenhum instante, procurar uma cartomante ou uma cigana para saber do meu futuro: a uma criança nunca passa pela cabeça saber o que lhe acontecerá no futuro.

Mas, se por acaso eu tivesse sabido o que iria me acontecer no futuro e tivesse gravado a previsão, minha vida teria perdido inteiramente a sua graça.

Saber do futuro não é só uma inutilidade, é também uma desgraça. O conteúdo principal da vida é desconhecer o futuro, esperar só pelo inesperado.

Não se deveria pagar consulta a cartomante para se conhecer o futuro. Ao contrário, uma cartomante que prediga o futuro de alguém terá de pagar ao consultante por essa intromissão indevida e trágica na sua vida.

A única dúvida que tenho é a seguinte: será que convém a nós sabermos de nosso passado? Explico: esses dias, eu estava deitado sem sono e comecei a vasculhar o meu passado. Fui desfiando episódios tristes da minha vida, acabei derramando lágrimas por sentir tanta pena de mim.

Ou seja, tanto o futuro quanto o passado deveriam ser vedados ao nosso conhecimento. O homem deve se guiar no presente sem se importar tanto com o futuro quanto com o passado.

Se não me engano, o samba-enredo célebre diz bem sobre isso: “A cigana leu o meu destino/ eu chorei”.

Agora mesmo, eu estou numa fase da minha vida, o portal da velhice, em que o meu futuro se resume em uma só palavra: a morte.

Por sinal, nunca pensei, durante a minha infância, adolescência e até grande parte da maturidade, em morte.

Só fui entender que minha vida acabaria com a morte quando fiz 60 anos. Aí preteou o olho da gateada, meu amigo Nilton Lerrer. Então, comecei a pensar na morte com insistência.

Mas até nisso o futuro nos intriga: como será depois da morte? Haverá outra vida? Seremos chamados a um Juízo Final para respondermos por nossos atos durante a vida? Os espíritas explicam melhor que nós esse dilema que nos aterroriza.

De minha parte, o meu autojuízo final é meio tranquilo. Acho que fiz o bem, nem tanto quanto seria necessário, acho que não me dediquei ao mal, mas me sobram dúvidas quanto ao detalhe de se eu deveria ter dedicado ou não minha vida a fazer o bem durante todos os dias e exorcizar o mal que me dominasse o espírito em algumas horas.

Eu confesso que guardo, por isso, um certo medo do Juízo Final.

A gente nunca sabe quais são os critérios do nosso julgador. Ficamos torcendo para que ele seja benevolente.

Só o que faltava, depois de tantos sacrifícios que encontramos nesta vida, que fôssemos nos defrontar, no Juízo Final, com um julgador severo!

Mas Deus é justo e, sendo justo Deus, ele haverá de nos compreender, perdoar os nossos pecados e dedicar-nos algumas, ainda que pequenas, recompensas pelas nossas boas ações.

É por isso que, desconfiado desse epílogo da vida, tenho me dedicado por vezes a praticar o bem, mas aquele bem alcandorado de São Francisco de Assis, o de amar os pobres, o de sob certo jeito beijar e auxiliar os leprosos, socorrer os desesperados, consolar os doentes e os presos, enfim, atirar-nos a fazer o bem a todos os mais necessitados.

Se fizermos isso, nos safaremos satisfatoriamente no Juízo Final.

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