segunda-feira, 5 de janeiro de 2009



05 de janeiro de 2009
N° 15839 - LUIZ ANTONIO DE ASSIS BRASIL


Ensinar a escrever?

Ensina-se a escrever literatura? – eis a pergunta que um jovem estudante faz ao escritor. A pergunta é tão desnecessária quanto perguntar se é possível ensinar a pintar, a esculpir, a tocar um instrumento musical, a dançar, a interpretar no palco ou na TV.

Todas essas são formas de expressão artística e, se não se discute que é possível ensiná-las, também não se discute, logicamente que é possível ensinar a escrever, já que a literatura é uma arte. O problema, portanto, não está aí.

É preciso um deslocamento do foco, e este está ligado à formação do escritor. Como um escritor forma a si mesmo? Os caminhos são múltiplos, concomitantes e não-excludentes: leitura atenta, reflexão, estudos teóricos, diálogos com escritores mais experientes e, se possível, frequência a uma oficina literária.

Quer-se dizer, simplesmente: a oficina é um dos caminhos disponíveis – e, talvez, um dos mais eficazes. Mas, agora, esse não é o ponto.

Como os laboratórios de texto passaram a existir apenas no século 20, é natural que nos séculos anteriores os aspirantes a escritor faziam sua aprendizagem utilizando os meios tradicionais. Contudo, evoca-se aqui o curioso depoimento de Guy de Maupassant: “Trabalhei durante sete anos com [Gustave] Flaubert, sem escrever uma linha.

Durante esses sete anos [ele] me deu as noções literárias que eu não teria adquirido nem com 40 anos de experiência”. É possível dizer, portanto, que o autor de Bola de Sebo frequentou uma oficina literária sim; no caso, uma oficina particular, privada [e possivelmente grátis] com Flaubert.

O mesmo acontecia com Balzac; em biografia recentemente publicada, verifica-se que esse escritor era muito procurado por autores estreantes, aos quais atendia sempre que se via de bom humor, e um dos conselhos que mais dava [e ele mesmo não seguia] era: “Escreva pouco, meu jovem, para que o crítico tenha menos a criticar”.

Estes são depoimentos de que temos registro documentado; os outros perderam-se, mas é fácil imaginar que foram desde sempre abundantes e consagradores. Qualquer escritor, aliás, pode atestar o quanto são devedores de uma palavra, de um ensinamento, de viva voz ou por correspondência, dos que o precederam.

Muitos, no Rio Grande do Sul, tiveram essa palavra de Erico Verissimo e Josué Guimarães, por exemplo, e não fazem disso segredo. Afinal, a literatura, como diz Ivan Ângelo, é uma corrida de bastão que já tem milênios. E mesmo considerando desnecessária a pergunta do jovem estudante, não podemos deixá-lo sem resposta. E esta, já a sabemos.

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