quarta-feira, 25 de maio de 2022


25 DE MAIO DE 2022
OPINIÃO DA RBS

INGERÊNCIA À VISTA

O espanto só não é maior porque os rumores ganhavam corpo nos últimos dias, depois da dispensa do ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, há duas semanas. Após apenas 40 dias no cargo, o presidente da Petrobras, José Mauro Coelho, foi demitido na segunda-feira à noite pelo Palácio do Planalto. O movimento tem uma única justificativa: a obsessão de Jair Bolsonaro em evitar novas altas nos preços dos combustíveis, a poucos meses das eleições.

As simples trocas no comando da estatal, com o objetivo de impedir reajustes da gasolina e do diesel, não deram certo até agora. Ou, como também se suspeita, eram apenas manobra diversionista. Joaquim Silva e Luna e Coelho, colocados no posto devido ao descontentamento de Bolsonaro com a política de preços da petroleira, acabaram se rendendo à institucionalidade e às regras do jogo e, mesmo que eventualmente tenham segurado temporariamente algum aumento, não cederam completamente ao instinto interventor do presidente.

Uma nova mudança agora, pouco mais de um mês depois da última, só será compreensível se, mesmo que de maneira marota, sem que nada precise ser anunciado com todas as letras ou colocado no papel, se parta para uma interferência mais efetiva. Especula-se que seria formulada uma alternativa para "espaçar" os reajustes, que dependem basicamente das oscilações do petróleo e do câmbio. Ao que parece, trata-se de um eufemismo para a intenção de segurar eventuais reajustes para após as eleições.

Assim, repete-se uma estratégia nefasta que pode até beneficiar o governo de turno no curto prazo, como ocorreu na época da gestão Dilma Rousseff, com o objetivo de evitar insatisfação da população e impacto disseminado na inflação. No passado recente, foi uma prática que causou grandes prejuízos à Petrobras, em volume até superior aos escândalos de corrupção. Mas a pressão por reajuste, caso condições como a valorização do petróleo persistam, é incontrolável. Mais cedo ou mais tarde, a majoração se materializa, com todos os seus reflexos infaustos. O populismo eleitoreiro tenta apenas adiá-la em proveito próprio.

Resta agora aguardar para ver se prevalecerá o desejo do presidente ou a nova governança da Petrobras e a força da lei das estatais que, até agora, conseguiram colocar um freio em ingerências mais escancaradas. Especialistas já alertam que o novo indicado, Caio Paes de Andrade, não preenche os requisitos legais para o posto. Ao que parece, regras criadas durante o governo Michel Temer para minimizar riscos de intromissão têm elevadas chances de serem ignoradas. A queda significativa das ações da Petrobras, ontem, mostra que a recepção da manobra foi ruim no mercado. 

O episódio também ilustra a forma caótica como o Planalto tenta gerir o problema complexo da alta dos combustíveis, que é global. Improvisos e voluntarismos, como sempre, estão fadados a não solucionar questões intrincadas. O ideal seria que a discussão estivesse no bojo de uma reforma tributária robusta voltada a simplificar o labirinto de impostos do país. Mas esse é um tema que o Executivo - tanto a atual gestão como as anteriores - e o Congresso mostram pouca disposição em encarar com seriedade. Seria uma forma viável de, dentro do possível, equilibrar os interesses da companhia e da sociedade, sufocada pelo surto inflacionário.

OPINIÃO DA RBS

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