quarta-feira, 3 de novembro de 2021


02 DE NOVEMBRO DE 2021
OPINIÃO DA RBS

TRUCULÊNCIA COMO RESPOSTA

As agressões a cinco equipes de reportagem que cobriam a passagem do presidente Jair Bolsonaro por Roma, na Itália, onde fez parte do encontro do G-20, lamentavelmente compõem um contexto cada vez mais desafiador para os jornalistas brasileiros e veículos de comunicação profissional. Episódios do gênero não têm sido isolados e, mais grave, parecem contar com o encorajamento ou ao menos com o beneplácito da mais alta autoridade da República, que se mostra outra vez refratária a preceitos democráticos, como a liberdade de imprensa.

Ainda em meados do mês passado, a Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP, na sigla em espanhol) divulgou o Índice Chapultepec 2021, que avalia os níveis de liberdade de imprensa e de expressão nas Américas. O Brasil, uma das maiores democracias do mundo, aparece em uma posição vexaminosa, mas que capta muito bem o momento atravessado. Entre 22 nações analisadas, é o 18º. Surge à frente apenas de Nicarágua, Cuba e Venezuela, que estão no pior dos cinco graus de classificação, o de "sem liberdade". O Brasil foi ranqueado no patamar "alta restrição", enquanto na ponta de cima os países de melhor pontuação são Uruguai e Chile. Dois quesitos verificados no índice são "exercício do jornalismo" e "violência e impunidade".

Não se pode naturalizar e aceitar que profissionais da imprensa sejam vítimas de insultos e violência física apenas por estarem cumprindo seu papel de perguntar para tentar obter esclarecimentos sobre assuntos de interesse público e levar a melhor informação possível à sociedade. Bolsonaro, repetindo circunstâncias anteriores, respondeu com impropérios a questões pertinentes e corriqueiras, como o motivo de não ter participado de alguns eventos do G-20 e de decidir não ir à COP26, em Glasgow, na Escócia. 

A cúpula do clima é um encontro considerado decisivo pelo mundo na construção de consensos que busquem frear o aquecimento global, um tema em que o Brasil deveria ser protagonista. O presidente, infelizmente, tem reiteradamente se mostrado truculento quando é indagado sobre temáticas que lhe desagradam ou quando simplesmente não tem explicação razoável. A missão dos jornalistas e da imprensa, no entanto, é exatamente a de jogar luz sobre fatos que necessitem de melhor elucidação, como atos de um presidente da República. A obrigação do governante, por outro lado, é prestar essas informações que, ao fim, são relevantes para os governados, seus eleitores ou não.

Intimidações, agressões e insultos, também enfrentados em diferentes graus em governos anteriores, não fizeram e não farão os profissionais do jornalismo recuar na tarefa de formular as perguntas necessárias. Mas é preciso uma reflexão sobre as perigosas consequências da escalada beligerante em curso. A violência física e verbal deve cessar. Aguarda-se ainda a devida apuração do ocorrido em Roma. O que está em jogo, afinal, é o direito constitucional da sociedade de ter assegurado o acesso à informação. Liberdade de imprensa é, além de base da democracia, um valor associado ao nível de desenvolvimento das nações.

 

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