
Onde terroristas trocaram armas pela política
Não é incomum, na história recente, grupos que utilizam o terrorismo como ferramenta política entregar as armas, como Donald Trump propõe ao Hamas no plano que prevê, em sua primeira fase, a libertação de reféns israelenses e a soltura de prisioneiros palestinos. Um dos primeiros a se desarmar foi o Exército Republicano Irlandês (IRA), que atuou por décadas buscando a reunificação da Irlanda, usando táticas armadas contra a presença britânica na Irlanda do Norte.
O Acordo de Paz da Sexta-Feira Santa, em 1998, foi um marco, estabelecendo um cessar-fogo e abertura para solução política. O IRA anunciou formalmente o fim da sua luta armada em 2005 e, após negociações com o governo britânico e mediação internacional, entregou voluntariamente o armamento restante. O desarmamento ajudou a consolidar a paz na Irlanda do Norte. Hoje, o Sinn Féin, braço político do IRA, passou a atuar como partido político.
Na América Latina, a deposição de armas pela guerrilha Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) foi a largada de um processo de paz após cinco décadas de guerra civil. As negociações duraram quatro anos e culminaram no acordo de paz de 2016. As Farc entregaram quase 9 mil armas à ONU em 2017 e hoje são um partido político chamado Força Alternativa Revolucionária do Comum. Apesar da entrega formal das armas, o processo enfrenta fragilidades ainda, com dissidências armadas e dificuldade de reitegração social dos ex-combatentes.
Voltando à Europa, há o exemplo recente do ETA (Euskadi Ta Askatasuna), grupo separatista que lutava por décadas pela instauração de um país basco na Espanha e na França. Após anos de terrorismo, anunciou o fim definitivo da luta armada em 2011.
Esse caso é diferente dos anteriores. Não houve negociações com governos ou ONU. O ETA se desarmou de forma unilateral. Também, ao contrário do IRA e das Farc, o grupo basco não se tornou um partido político. O Batasuna, que operava como um braço político do movimento separatista, foi colocado na ilegalidade em 2003 pelo governo espanhol, em um contexto pós-11 de setembro de 2001. Leis espanholas impedem legalização de partidos ligados ao terrorismo.
De olho no Oriente Médio
No caso do Oriente Médio, é muito difícil o desarmamento do Hamas por vários motivos: a destruição de Israel é ponto central de sua existência, um objetivo que não é viável dentro da disputa política tradicional, o que inviabiliza a hipótese de se tornar um partido político tradicional. Aliás, o que nos territórios palestinos o Hamas já é - tanto que disputou eleições em Gaza em 2006 e derrotou a Fatah, partido de Mahmoud Abbas, herdeiro de Yasser Arafat. Outra dificuldade se dá a partir da libertação de prisioneiros - por isso, a ultradireita israelense é contrária ao acordo, dizendo que líderes terroristas serão soltos e poderão, após a fase de fragilização, reorganizar o grupo.
Um terceiro argumento é que a própria guerra costuma ser uma celeiro de terroristas: uma geração pode se formar a partir da opressão, insuflada por líderes carismáticos e com sede de vingança.
Um modelo possível seria do Hezbollah, no Líbano: um partido político legalizado, com membros no parlamento, mas com um braço armado tão ou mais poderoso do que o próprio exército do país. Mas um Hamas que continuasse armado, ao modelo libanês, não seria aceito por Israel ou EUA, o que implodiria qualquer continuidade de plano de paz. _
Bilhetes e sussurros
As cenas que antecederam o anúncio de Donald Trump de que Israel e o grupo terrorista Hamas haviam chegado a um entendimento sobre o cessar-fogo em Gaza lembraram uma das imagens icônicas dos anos 2000: o momento em que George W. Bush foi avisado pelo chefe de Gabinete, Andrew Card, de que o segundo avião comercial havia sido arremessado contra o World Trade Center, em Nova York.
Na manhã de 11 de setembro de 2001, o então presidente visitava uma escola de Sarasota, na Flórida, e estava lendo um livro para as crianças. Àquela altura, ele sabia que um avião havia se chocado contra o prédio, no entanto se pensava que seria uma aeronave pequena.
- Um segundo avião atingiu a segunda torre. A América está sob ataque - sussurrou Card.
O rosto de Bush, entre a surpresa e o estupor, foi eternizado pelas câmeras.
Na quarta-feira, Trump estava em uma mesa redonda com influenciadores conservadores na Casa Branca quando recebeu um bilhete de seu secretário de Estado, Marco Rubio. O funcionário cochichou em seu ouvido que tinha novidades para Trump, mas que teria de esperar até que a imprensa saísse. Em seguida, ele entregou ao presidente um bilhete. Fotógrafos flagraram a mensagem no papel com timbre da Casa Branca: "Você precisa aprovar uma postagem no Truth Social logo, para poder anunciar o acordo primeiro".
Trump mencionou o bilhete, mas não divulgou seu conteúdo. Disse apenas:
- Acabei de receber um bilhete do secretário de Estado dizendo que estamos muito próximos de um acordo no Oriente Médio e que vão precisar de mim em breve. Então, responderemos a mais algumas perguntas.
O presidente ainda ficou na sala por 10 minutos, gerando impaciência em Rubio. O anúncio só foi feito depois, por meio de sua rede social, a Truth Social. _
Diálogo funcionou
A imensa maioria dos reféns libertados ao longo desses mais de dois anos de guerra ocorreu em meio a acordos entre Israel e o Hamas. Apenas três foram resgatados em operações militares: em 12 fevereiro de 2024, argentino-israelenses foram resgatados pelas forças armadas, e em um 27 de agosto daquele ano, um refém beduíno israelense foi salvo. Uma das críticas comuns entre os parentes dos sequestrados em Israel é que ações militares colocam em risco a vida de seus familiares - até porque é comum o Hamas usá-los como escudos humanos.
Ainda que negociar com terroristas seja uma estratégia criticada por muitos, o diálogo acabou sendo mais efetivo ao trazer de volta os cativos. _
Daqui a um mês, a COP30
No dia 10 de novembro, ou seja, exatamente daqui a um mês, milhares de pessoas circularão pelo Parque da Cidade, em Belém (PA), durante a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30).
A coluna estará lá para cobrir o evento, trazendo a você, nas páginas de Zero Hora e no GZH, todas as informações e os bastidores.
Aliás, a coluna buscou uma atualização com a Secretaria da COP30 (Secop) sobre o número de delegações confirmadas. Até ontem, 87 países já haviam confirmado hospedagem em Belém para o evento, e outros 90 estão em negociação. _
países confirmaram hospedagem em Belém para participar da COP30
nações, por sua vez, ainda negociam onde vão ficar durante o evento
Novidades para merendeiras
Você, leitor desta coluna, deve lembrar o drama de merendeiras de escolas públicas estaduais que ficaram longos períodos sem receber seus salários e outros direitos. Essas trabalhadoras, contratadas por empresas terceirizadas, em várias ocasiões ficavam na mão, com atrasos que, muitas vezes, chegavam a meses. Pois ontem, o governador Eduardo Leite assinou um decreto que moderniza a gestão e a fiscalização das contratações de serviços terceirizados no âmbito do Executivo estadual.
A principal inovação é a criação de uma conta vinculada a cada contrato, que permitirá ao Estado reter valores referentes a encargos trabalhistas, garantindo o pagamento aos empregados, mesmo em situações de inadimplência das empresas contratadas. _
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