
Teleamigos, telepiadas, hora certa. As pessoas são receosas de emprestar o celular ao marido ou à esposa - e mesmo aos filhos, como passatempo para distraí-los. Enfrentam o medo da invasão de privacidade.
Somos viciados e compulsivos em nossas individualidades. Imagine um único telefone de uso comum para a família inteira. Nos anos 70 e 80, partilhava-se um fixo. Havia um só número, com um aparelho na sala e outro no quarto dos pais, que mantinham o controle de tudo.
Se meus irmãos e eu atendíamos um colega da escola, eles chegavam ao despudor de nos ouvir na extensão: arapongas afetivos, espiões de nossos romances, auditores de nossas amizades. Escutavam nossas confidências secretas, proibidas, passionais. Descobríamos a presença deles pela respiração pesada. Ou porque, no fim, tossiam ou espirravam em seus grampos domésticos.
Gritávamos: - Baixe o fone aí, está ocupado! Não devíamos nos estender demais na prosa. Forçavam interrupções de seu esconderijo, girando números no disco de vidro como se quisessem fazer uma ligação. Tratava-se do aviso para desocupar imediatamente: um ultimato, um constrangimento.
O mandamento mais corriqueiro vinha na forma de reprimenda: - Telefone é para dar recado, não para bobagens. Naquela época, era preciso permanecer parado no corredor para conversar, no aparato constituído pela mesinha, a toalhinha de crochê, a lista telefônica e a cadeira. O cabo preso à tomada não nos permitia ir para longe.
Abstraíamo-nos do lugar. Enrolávamos o fio espiralado entre os dedos, como um terço. O bocal emanava um chulé das nossas bocas. Requeria limpeza mensal para a remoção do mofo dos perdigotos. Desenroscávamos a peça de plástico cheia de furinhos. Ainda sofríamos com as linhas cruzadas: uma voz desconhecida entrava do além.
As ondas eletromagnéticas de dois aparelhos se sobrepunham, especialmente quando os fios estavam muito próximos ou danificados. Estranhava-se o timbre intruso surgido do nada: "quem é você?". Convencíamos o sujeito a desligar. Às vezes, ele insistia e não arredava o pé. A saída que nos restava era bater o gancho, temendo que fosse um psicopata.
Quem se sentia sozinho recorria ao 138, que apresentava a oportunidade do teleamigos, em que você interagia com usuários dos mais diferentes Estados.
A conta aumentava astronomicamente no fim do mês. Vai parecer loucura para as gerações digitais, mas pagávamos pelo serviço da hora certa da CRT no 130, que oferecia uma singela gravação do horário em segundos.
Também colecionávamos taxas de aproximadamente R$ 0,20 com telepiadas, horóscopo ou meteorologia. Quem tem mais de 40 anos desfruta de uma espartana paciência. Passou por cada uma que ninguém acredita.
CARPINEJAR
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