
O cheiro do sol, o medo da chuva
Uma das minhas lembranças mais longevas e marcantes é atravessar os lençóis estendidos no varal do quintal. Ir de um lado ao outro, molhando a testa. Como se eu fosse um fantasma passando por paredes de pano. Vinha o perfume do amaciante ou do sabão de coco. Aquela sensação única de cobrir o rosto com o tecido e escapar pela fronteira inventada.
Eu corria incansavelmente, touro e toureiro de mim mesmo, até ser advertido pela mãe de que eu estaria sujando tudo com o meu suor. Derrubava, frequentemente, com uma rasteira, a vara de bambu que levantava os fios pesados das mudas.
Experimentávamos um tempo honesto de ciclos e estações. Respeitávamos o clima com a reverência sagrada de uma missa, sem secadora, sem facilidades tecnológicas, com o predomínio das casas e das áreas abertas aos latidos dos cachorros, aos piares e volteios dos pássaros, e com o portão lateral para a rua, usado pela família, que não entrava pela porta da frente.
Saíamos de casa preocupados com a roupa a ser recolhida. Uma das tristezas era estar no trabalho e lamentar a lavagem doméstica arruinada por uma chuva repentina. Telefonávamos, desesperados, para quem estivesse de prontidão no lar, a fim de acudir o inesperado. Quantas vezes meus irmãos e eu largamos as brincadeiras e o que estávamos fazendo para apanhar, juntos, as peças ao anúncio de um toró, naquele ambiente irresistível de terra e grama úmidas.
Nem protestávamos diante dos ditames e das regras, nem nos rebelávamos contra nossa condição de zeladores do patrimônio. Empilhávamos prendedores de madeira no bolso: esses pregos da leveza, do céu, do invisível. Era uma gincana, uma ciranda: salvar da água o maior número de roupas. Enchíamos os braços com o que fosse possível pegar.
Naquela época, cultivávamos um ritual: esfregar, esticar, esperar, rezar. As calças, camisas e vestidos tremulavam ao vento como bandeiras torcendo pela nossa vida.
Criávamos uma cumplicidade com a paciência, com a arte minuciosa de cumprir cada etapa do processo para, só então, partir para a seguinte. Nada secava na hora, e aprendíamos a formar esperança e saudade, nos intervalos da aceitação manual da existência. Prevalecia a dignidade de vestir o algodão com cheiro de sol, nossa assinatura do asseio, de ser feliz. Cobríamos a pele com o capricho.
Orgulhávamo-nos do pouco que tínhamos, não ostentávamos o que queríamos ser. Hoje, lavamos roupa suja em público: nas redes sociais, nos grupos de WhatsApp. Não guardamos nossa privacidade, nossas dores - fornecemos trapos vexatórios para o espetáculo.
Antigamente, tirávamos o peso pegajoso e a poluição do mundo com as mãos. Agora, penduramos as mágoas nos stories. Atualmente, escondemos nossos figurinos de grife nas máquinas. Antes, por mais simples que fossem, mostrávamos para todos verem.
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