
29 de Outubro de 2025
OPINIÃO RBS
A escolha dos argentinos
Os argentinos foram às urnas no domingo para a eleição legislativa de meio de mandato e deram a vitória ao partido A Liberdade Avança, do presidente Javier Milei. O resultado reflete a rejeição ao populismo peronista, a busca por evitar um colapso financeiro imediato com uma derrota que inviabilizaria o governo e a manutenção da esperança de que o ultraliberal ainda seria capaz de tirar o país do ciclo infindável de crises com a sua agenda de cortes radicais de gastos públicos e reformas profundas.
Ninguém sente mais as dores da Argentina do que a própria população. Sopesados os prós e contras, a escolha do eleitor foi por dar uma nova chance ao governo. Isso a despeito da continuidade das incertezas econômicas, do ajuste fiscal recessivo e com severos impactos sociais, das denúncias de corrupção que rondam o núcleo do poder e do estilo pessoal agressivo de Milei. Restou claro que, em primeiro lugar, a eleição expressou o temor pela volta do passado recente de descontrole das contas públicas e hiperinflação legado pelo peronismo. Junto à percepção de que ainda valeria a pena o sacrifício de suportar uma série de medidas impopulares para manter a fé na estabilização do país.
O desfecho da eleição garante ao menos que a gestão do libertário não terá mais seus vetos derrubados no Congresso, o que assegura algum fôlego político para os próximos dois anos. Essa condição foi obtida pelo resultado combinado da agremiação de Milei com a do PRO, sigla liderada pelo ex-presidente Maurício Macri, aliado do governo. Juntos, passam a ter mais de um terço da Câmara e do Senado. Mas ainda será preciso compor com outras forças para garantir uma governabilidade mais sólida, que permita aprovar as reformas que promete, como a trabalhista, a previdenciária e a tributária. Para isso, Milei terá de ser menos histriônico e mais propenso ao diálogo com os partidos.
A despeito da dureza que segue na vida dos argentinos, há indicadores que mostram avanços. A inflação, que em 2023 fechou em 211%, vai encerrar 2025 ao redor dos 30%. Em 2024, houve o primeiro superávit orçamentário em mais de uma década. O PIB deve subir algo próximo de 5%. A pobreza, depois de subir, retrocedeu.
Ainda assim, Milei tem um desafio considerável à frente, que, se não for bem administrado, pode levar a Argentina a ter mais uma fracasso. O governo insiste no mesmo erro do passado de tentar segurar a inflação controlando artificialmente o câmbio. Isso incentiva importações, tira a competitividade das exportações e faz as reservas em dólar secarem. É sangue na água para os especuladores. A linha de swap de US$ 20 bilhões dos EUA é apenas um paliativo. A dificuldade é encontrar uma saída para flexibilizar o câmbio sem que os preços disparem.
Por ser identificado como de extrema direita e pela postura belicosa, Milei desperta paixões e aversões do lado de cá da fronteira. Mas deve-se levar em conta, em primeiro lugar, que é benéfico ter a nação vizinha, com um mercado do tamanho do de São Paulo, restabelecida. É, por exemplo, um dos principais destinos de bens industriais do país e do Estado e origem de um enorme contingente de turistas. Uma Argentina recomposta também fará bem ao Brasil.
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