quarta-feira, 2 de julho de 2025


02 de Julho de 2025
OPINIÃO RBS

Gramado e os dilemas do crescimento

É compreensível a decisão da prefeitura de Gramado de editar dois decretos que paralisam por seis meses a expedição de alvarás para hotéis com mais de 20 apartamentos e para restaurantes na área central com mais de 20 cadeiras. O município, destino turístico mais badalado do Estado e uma das viagens mais desejadas pelos brasileiros, experimenta um crescimento imobiliário e de empreendimentos de hotelaria e gastronomia bastante acelerado nos últimos anos, sem que a infraestrutura evoluísse no mesmo ritmo. 

O resultado tem sido problemas de trânsito e incapacidade do fornecimento de água tratada e da coleta de esgoto acompanharem a expansão. Empresários do próprio setor do turismo também citam o risco de uma criação excessiva de leitos.

Esses 180 dias, portanto, devem ser bem utilizados para que o poder público, operadores e comunidade reflitam sobre o futuro da cidade. Espera-se que, ao fim, decida-se pelo que for melhor para o desenvolvimento sustentável de Gramado. São legítimas as preocupações de que uma expansão desenfreada sature o município e prejudique a experiência dos visitantes, uma vez que a cidade, além dos atrativos mais famosos, tem como trunfos a qualidade dos serviços, o acolhimento, a tranquilidade, os deslocamentos rápidos e a natureza exuberante. 

Uma descaracterização poderia ser prejudicial à imagem de Gramado. Mas, por outro lado, o próprio mercado é capaz de se autorregular, conforme o balanço entre oferta e demanda, e compreender a importância de manter os atributos que fazem a fama da cidade. Concorrência também é salutar e leva a mais eficiência.

Após esses seis meses, os decretos podem ser prorrogados ou apenas deixar de valer. Em 2017 e 2019, outras ações do gênero suspenderam a análise de empreendimentos, também pela percepção de um crescimento um tanto desmedido. Nota-se que não é uma preocupação nova no município. É válido, portanto, reexaminar o ordenamento a guiar o crescimento inevitável da cidade, levando em conta também as necessidades dos cerca de 40 mil moradores.

Segundo a prefeitura, apenas no ramo da hospedagem, 216 empreendimentos operam no município. Somam 24,7 mil leitos. Existem mais 13 em construção. A estimativa é de que, em cinco anos, 9,9 mil leitos sejam criados. Alega-se ainda que a taxa média de ocupação nos últimos anos ficou abaixo de 50%. Os aluguéis de temporada são outra preocupação do setor.

A decisão a ser tomada pode influenciar a velocidade da expansão imobiliária e de novos negócios em Gramado, mas parece inequívoco que a expansão prosseguirá. É imprescindível, portanto, que a infraestrutura de tráfego e de saneamento acompanhe esse movimento.

Mesmo que, devido às enchentes, o número de visitantes tenha caído 25% em relação ao ano anterior, cerca de 6,5 milhões de viajantes estiveram na cidade em 2024. Tamanho movimento também beneficia os demais municípios da Região das Hortênsias e outras partes da Serra que exploram as belezas dos cânions ou o enoturismo. A visitação a Gramado beneficia agências de viagens gaúchas e o ramo de transporte e gera fluxo no aeroporto Salgado Filho, por exemplo. O crescimento saudável do turismo em Gramado, portanto, não tem reflexo apenas local. 

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