
Ataque desidratado e incoerente
Fiel ao seu estilo errático e incoerente, o presidente dos EUA, Donald Trump, assinou ontem a ordem que impõe tarifaço de 50% sobre as importações de uma série de produtos do Brasil a partir de quarta-feira, mas deixando centenas de itens fora da taxação. A lista de exceções, muito acima do esperado, comprova uma das características de Trump como negociador, a de fazer ameaças que depois não se confirmam totalmente. Ficaram fora da cobrança extraordinária especialmente bens que os EUA não produzem ou que são complementares e matérias-primas para a indústria norte-americana.
Mas que fique claro: a despeito da abrangência dos produtos ilesos à oneração proibitiva, a agressão comercial de Trump é rasteira e injustificada. Ao tentar prejudicar a economia brasileira por razões políticas, o inquilino da Casa Branca avilta laços diplomáticos que atravessam dois séculos. As relações históricas de Estado entre os dois países deveriam prevalecer. Nações, afinal, são perenes, enquanto os presidentes são transitórios. Mas Trump, apequenando o cargo que ocupa, preferiu colocar afinidades ideológicas à frente.
No decreto, saltam aos olhos as motivações desvairadas e falsas citadas por Trump. É risível afirmar que tomou a decisão por que ações brasileiras "constituem uma ameaça incomum e extraordinária à segurança nacional, à política externa e à economia dos Estados Unidos." Como é amplamente sabido, os EUA são superavitários nas trocas com o Brasil, que age apenas de acordo com os próprios interesses, e não para prejudicar quem quer que seja.
É também caricato sustentar que os EUA atuaram para proteger a liberdade de expressão. O próprio Trump tem feito ataques e retaliações a veículos da imprensa norte-americana e seu governo ameaça o livre pensamento nas universidades locais e vasculha redes sociais de candidatos a vistos de estudantes para barrar quem por acaso tiver uma visão distinta da que a Casa Branca considera o certo.
As incoerências prosseguem ao apontar que o Brasil promove ataques aos direitos humanos, ao mesmo tempo que os EUA caçam e prendem sob condições degradantes milhares de imigrantes, e ao falar de eleições justas, algo que Trump e seu pupilo, Jair Bolsonaro, não respeitaram. Por fim, o republicano não admite que empresas operando no Brasil têm de respeitar as leis e a Justiça brasileira, o que também levou à decisão draconiana de sancionar o ministro do STF Alexandre de Moraes com a lei Magnitsky, empregada para punir estrangeiros por violação a direitos humanos. De nada adiantará. O processo contra Bolsonaro, acusado de golpe de Estado, mas com direito à ampla defesa, seguirá indiferente à tentativa de intervir na soberania brasileira.
Apesar de o tarifaço ser menos indigesto do que sugeria a intimidação inicial, ainda deve o Brasil manter os esforços para ampliar os canais de diálogo e buscar novas flexibilizações. Convém ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva moderar o falatório de palanque. A indústria gaúcha, por exemplo, permanece bastante penalizada pela taxação.
A repercussão econômica, ainda que de menor magnitude, ocorrerá. Uma tarifa de 50% inviabiliza exportações. Os setores mais prejudicados merecem medidas que atenuem o impacto nos negócios e protejam os empregos do assédio sem precedentes de uma nação estrangeira incentivada por quem se dizia patriota.
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