
17 de Julho de 2025
GPS DA ECONOMIA - Marta Sfredo
Investigação do USTR é grave, mas cria rito
A situação surrealista do Brasil, único país com o qual os Estados Unidos têm superávit comercial a ser atingido pelas "tarifas punitivas", recebeu mais uma pincelada de absurdo com a abertura de "investigação comercial". A justificativa é investigar "práticas consideradas injustas (...) em comércio digital, pagamentos eletrônicos e tratamento a empresas americanas de tecnologia".
Como a carta de Trump, é um atentado às instituições nacionais. Embora o conceito de soberania tenha sido desgastado, é bom lembrar do que se trata: o direito exclusivo de um Estado - no sentido de nação - de exercer poder e tomar decisões sobre si mesmo.
Os riscos da investigação do Representante de Comércio dos Estados Unidos (USTR na sigla em inglês) são considerados maiores do que os do tarifaço. A base legal é a seção 301 do Código de Comércio dos EUA, que prevê compensações, caso a queixa seja considerada procedente. Podem ser adotadas, por até quatro anos, tarifas adicionais - sobre os 50% -, cotas ou restrições.
Um lado "menos ruim"?
Embora não seja um consenso, analistas e integrantes do governo veem um lado "menos pior" no processo. É bom lembrar que chefes de Estado como Volodimir Zelensky já foram chamados a "negociar" e se tornaram alvos de bullying em pleno Salão Oval da Casa Branca. É preciso tomar cuidado, até porque não é uma negociação, é uma imposição.
Ponderam que, ao menos, a investigação tem um rito. O USTR prevê que o Brasil envie "comentários por escrito" até 18 de agosto, que vão basear uma audiência em 3 de setembro. Há uma base para diálogo ao menos nos casos das "tarifas preferenciais" e das "restrições ao acesso ao mercado de etanol".
Mas se há pontos negociáveis, outros são disparates, como o Pix. Para comparar, é como se o Brasil reclamasse da maior competitividade dos EUA no comércio exterior por ter melhor logística do que a nacional. A queixa sobre propriedade intelectual baseada na Rua 25 de março, de São Paulo, é simplesmente ridícula. Trump precisa passar na Canal Street, em Nova York, onde se vendem produtos falsificados às pencas. _
Por que a Natura investe no RS
Pouco mais de um ano depois de ter perdido para a água seu centro de distribuição (CD) em Canoas, a multinacional brasileira de beleza Natura retoma sua operação em outra cidade gaúcha.
A unidade em Cachoerinha está funcionando desde 27 de maio, mas a inauguração ocorreu ontem.
A empresa não revela o valor investido na mudança. O novo CD deve empregar cerca de 200 pessoas. A instalação é uma parceria com a Cubbo Brasil, dona da estrutura de 10 mil metros quadrados.
Até a retomada em Cachoerinha, o Estado era abastecido a partir da operação de São Paulo. Conforme o diretor de cadeia de suprimentos da Natura, Eduardo Sá, com logística mais próxima, 80% dos pedidos realizados no Estado serão entregues em até dois dias. Na Região Metropolitana, há chance de receber no mesmo dia.
- O Estado é super-relevante na nossa estratégia. Quando fechamos a operação de Canoas, houve impacto no serviço, mas tínhamos certeza de que era preciso voltar até para manter a qualidade.
A unidade atende as 80 mil consultoras de beleza de Natura e Avon no RS, além dos consumidores do e-commerce. As 58 lojas no Estado continuarão sendo supridas por São Paulo. _
Quem faz o dólar subir, Trump ou Lula?
Desde o anúncio da alíquota de 50% para as exportações do Brasil aos EUA, no dia 9, o dólar subiu 2% ante o real. Na avaliação de Fabio Kanczuk, ex-diretor de Política Econômica do Banco Central (BC), hoje diretor de macroeconomia do Asa, o motivo é outro:
- Aumentou a probabilidade de reeleição do Lula, pegou o dólar. A gente está mensurando que mudou cerca de 10% com essa andada do Trump.
Afirma que, se o pleito fosse hoje e houvesse 100% de chance de eleição de Lula, o dólar seria de R$ 6. E completou:
- E se tivesse 100% de chance de o Tarcísio (de Freitas, atual governador de São Paulo) ser eleito, o dólar estaria em R$ 5. Agora, o câmbio pulou, mais ou menos, de R$ 5,45 para R$ 5,55. É como se a probabilidade do Lula de ser eleito tivesse mudado de 45% para 55%.
A tese de Kanczuk é de que o dólar não sobe porque o Brasil vai exportar menos, mas porque afeta as perspectivas para 2026:
- O dólar vai mexer porque o discurso político da situação ficou melhor, aumentou a probabilidade de reeleição do Lula.
Segundo Kanczuk, o Asa projeta redução entre 0,3 e 0,4 ponto percentual no crescimento do PIB como efeito do tarifaço. Mas alerta que essa desaceleração não ajuda na redução da inflação, porque o que cai é a demanda externa, não a interna. A perda de negócios com os EUA corrói a lucratividade das exportadoras, que acabam precisando reduzir produção e até demitir.
Ontem, o dólar o dólar fechou quase estável com oscilação para cima de 0,06%, para R$ 5,561. O que ecoou foi a especulação, depois "desmentida", de que Donald Trump quer demitir o presidente do Federal Reserve (Fed), Jerome Powell, antes do final de mandato. _
Gaúcho diz que exportador pode precisar de ajuda
Além de Haroldo Ferreira, presidente da Associação das Indústrias de Calçados (Abicalçados), outro gaúcho participou das duas rodadas de consulta do governo Lula a exportadores afetados pelo tarifaço de 50% de Donald Trump.
Thômaz Nunnenkamp representou a Federação das Indústrias do Estado (Fiergs) na reunião da tarde de terça-feira, focada no agro - o que inclui a agroindústria.
- (O tarifaço) Virou assunto político, não só econômico. Não é questão quem está com a razão, todos querem que se volte para a situação anterior (tarifa de 10%) - afirma.
Nunnenkamp pondera que existe muita assimetria entre os prejudicados, não só entre setores mas até entre empresas do mesmo setor:
- Por exemplo, os EUA representam 20% das exportações de calçados brasileiros, mas as compras do Brasil representam uns 0,5% para os americanos. É fácil encontrar outro fornecedor. Com café e suco de laranja não é bem assim.
Para as empresas mais dependentes das exportações para os EUA, defende o empresário, será preciso encontrar ou solução ou compensação:
- É preciso que o governo pense em medidas para ajudar empresas, como ocorreu na pandemia e na enchente aqui no Estado, pensar em alternativas como layoff (suspensão temporária dos contratos de trabalho) ou créditos, porque não é fácil achar outro mercado para produtos como suco de laranja e café.
Nunnenkamp foi o candidato à presidência da Fiergs que perdeu a eleição para Claudio Bier por um voto. Não compõe, portanto, a atual diretoria. Mas disse que foi representar a entidade na reunião da tarde porque já estava em Brasília na terça-feira. _
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