
Um tiro na Quinta Avenida
Donald Trump tirou benefícios dos pobres para diminuir o imposto dos ricos. Aceitou mimos, pagou suborno, conspirou, roubou documentos, cultivou amizades suspeitas, chantageou. Também mentiu, exagerou, se contradisse, voltou atrás, traiu. Mas nada, nunca, arranhou sua popularidade entre seus apoiadores mais fiéis. Em 2016, antes mesmo de vencer suas primeiras primárias, Trump disse uma frase que mais tarde se mostraria visionária: "Eu poderia ficar no meio da Quinta Avenida, atirar em alguém, e não perderia nenhum eleitor, ok?. É, tipo, incrível".
Pois chegou a hora de testar a teoria do "tiro na Quinta Avenida". Parte considerável do movimento MAGA anda furiosa com a forma como Trump vem tratando o mal resolvido Caso Epstein. Recapitulando: acusado dos crimes de pedofilia e tráfico de menores, o milionário Jeffrey Epstein enforcou-se na prisão poucos dias depois de ser preso, em 2019. Ironicamente, o fato de Trump ter sido, durante mais de 15 anos, um dos melhores amigos de um pedófilo condenado pela Justiça nunca incomodou ninguém. Na verdade, o oposto aconteceu.
O que ganhou tração na bolha da extrema direita foi a tese de que havia uma lista secreta de clientes de Epstein contendo nomes influentes do Partido Democrata - e que apenas Trump teria coragem de trazê-la a público. Não espanta que a ideia de uma "lista secreta" tenha entusiasmado tanto o universo MAGA. Uma teoria conspiratória envolvendo pedofilia, elites corruptas e arquivos bombásticos é um banquete para quem almoça e janta na realidade paralela das fake news.
Ocorre que Trump foi eleito, não fez nada a respeito e ainda mandou todo mundo achar uma nova teoria maluca para se ocupar. Pela primeira vez, seus eleitores se sentiram traídos e cobraram explicações. Com um empurrãozinho de Elon Musk, que percebeu no caso um ponto fraco do ex-amigo, o assunto não para de crescer nas redes sociais. Na semana passada, Trump finalmente solicitou ao Departamento de Justiça a divulgação de todos os depoimentos do júri do Caso Epstein, mas ele mesmo admite que isso não deve ser suficiente para acalmar os ânimos.
Ninguém sabe se existe a tal lista secreta de clientes, até que ponto o presidente está comprometido e onde isso tudo vai acabar. De qualquer forma, por enquanto, o Brasil pode reclinar-se na poltrona e assistir Donald Trump sendo acossado por fantasmas do passado que seus próprios apoiadores ajudaram a acordar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário