sexta-feira, 25 de julho de 2025


25 de Julho de 2025
CARPINEJAR

Morango do amor

Você ouviu falar em "morango do amor"? Caso não, está duas semanas atrasado. É só o que se comenta nas redes sociais. Partiu de um vídeo viral de um chef direto para as vitrines das confeitarias.

Lembra uma música sertaneja, mas não é: trata-se simplesmente da fruta açucarada. Ninguém quer ficar de fora. Não tem nada demais, nada que justifique o excessivo alarde. É a reformulação da clássica maçã do amor, agora com morango envolto em brigadeiro de leite Ninho e cobertura crocante e vermelha.

Basicamente, é um bombom. Uma trufa semelhante a qualquer uma que você já degustou antes sem dar o mesmo destaque.Mostra-se mais gostoso por causa do batismo sedutor e da oferta instagramável: ideal para surpresas e convites românticos.Se a maçã do amor lembrava circo, zoológico, parque e festa junina, numa experiência infantil de passeio em família, a réplica gourmetizada traz um desejo adulto: de gula e de romance.

É como se a maçã fosse a infância, e o morango, sua versão erotizada. Curiosamente, o tempo avança e as idealizações diminuem de tamanho - do maior para o menor. O que há de novo é o nome e a intenção. O que muda é o envolvimento dos cinco sentidos, a explosão do sabor.

A maçã do amor tem uma cobertura resistente e dura de caramelo, feita com açúcar, vinagre e corante vermelho. A crosta é rígida, difícil de comer em público, gerando malabarismo e embaraço. Gruda na pele, na roupa. É uma cola que deixa vestígios e da qual o guardanapo não dá conta. Para limpar, apenas com álcool gel. Seu formato é lúdico, próprio para brincar: o fruto vem inteiro no palito, brilhante, num microespeto proposital, para girar como um carrossel. Talvez seja um brinquedo comestível, mais para entreter do que para saciar. Sua vida é efêmera e nem um pouco prática: não suporta a mordida e cai no chão. Raramente alguém chega até o fim. Quem não chorou, quando pequeno, ao não conseguir segurá-la?

Já o morango do amor é portátil, leve, macio por dentro, cremoso ao redor, com uma fina casquinha crocante que não exige esforço para ser atravessada. Cabe na mão e pode ser colocado inteiro na boca. Se a maçã inventou biblicamente o pecado, o morango sempre foi mais afrodisíaco.

É impressionante a velocidade da tendência. Docerias desfrutam de uma segunda Páscoa e relatam filas com 150 a 220 unidades vendidas em 24 horas. As fornadas esgotam em minutos, e a inflação acompanha o consumo. Uma amiga comprou uma caixa com nove unidades por R$ 250,00 há cinco dias, hoje está valendo R$ 425,00.

O produto ganhou todo tipo de recheio, ampliando o repertório: chocolate, leite condensado e coco ralado, farofa de biscoito, Nutella, pistache, castanhas, crème brûlée, maracujá.

A epidemia, à primeira vista, revela o quanto somos influenciáveis. Mas vejo um fundo emocional nesse gesto, além da realidade aparente. Expõe nossa carência de pertencimento. Nunca tivemos tanta necessidade de nos parecermos uns com os outros. Estamos profundamente solitários. É um atestado do nosso isolamento. É mais falta de amor do que morango. 

CARPINEJAR

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